segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

Isto é uma espécie de declaração de amor


Caetano e Chico, juntos, e ao vivo. Os dois trovadores, queridos inimigos da ditadura militar que governou no Brasil de 1964 a 1985, a driblar a censura com onze temas, daqui e dalí, reunidos num concerto único, com menos de 40 minutos e sem dúvida transbordante; um espernear simbólico da Música Popular Brasileira contra o regime opressor. Gravaram-nas no Teatro Castro Alves, em Salvador da Bahia, 1972, mas nem sempre como as passámos a trautear. A relação zangada de Caetano com Deus - "Partido Alto" -, a sugerida entrega de "Bárbara" a outra mulher, capítulo do maravilhoso livro que é o "eu" feminino de Chico; tudo coisa para censurar mais cedo do que tarde. Se não for pela desarmante "Atrás da Porta", se não for pelo mosaico perfeito de "Ana de Amsterdam", valerá sempre a pena ouvir “Bárbara”, dueto entre esta e aquela personagens, uma e outra vez, e aplaudir tão entusiasticamente quanto possível quando sentimos chegar os versos proibidos:

"Vamos ceder enfim à tentação
Das nossas bocas cruas
E mergulhar no poço escuro de nós duas."

terça-feira, 16 de dezembro de 2008

Um Castelo na Escócia Song Awards 2008

Critério: de bichinhos diferentes; mesmo, mesmo boas.

15. "Gobbledigook"; Sigur Rós
14. "Ragged Wood"; Fleet Foxes
13. "2080"; Yeasayer
12. "This boy’s in love"; The Presets
11. "A-Punk"; Vampire Weekend
10. "Another Day"; Jamie Lidell
9. "Silence"; Portishead
8. "Goodnight, Bad Morning"; The Kills
7. "Graveyard Girl"; M83
6. "Time to Pretend"; MGMT
5. "In the New Year"; The Walkmen
4. "You! Me! Dancing!"; Los Campesinos

3. "So Haunted"; Cut Copy
2. "Ghost Under Rocks"; Ra Ra Riot

1 - "Blind"; Hercules and Love Affair

quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

Hum, e The Walkmen a noite inteira, não?


É difícil estar a dez metros de Hamilton Leithauser, e, de olhos fechados, deixar de pensar que Bob Dylan está de volta. Não que a música dos Walkmen tenha algo a ver com a que o cabecinha de “Blowin’ in the Wind” compunha nos tempos em que, sem querer, era o megafone de uma geração. O motivo é outro, tem a ver com a voz do rapaz, que é igual à do primeiro Dylan, nos anos 60, quase constipada; assustadoramente igual. A garganta bem aberta, os gritos ao vento – lá está -, em jeito de sermão, o timbre, o tom, igual. As semelhanças, porém, terminam aí.

Na primeira vez que aterram em Portugal para tocar em concerto, no segundo dia do festival de Inverno Super Bock em Stock (SBST), os Walkmen tinham como público um conjunto de pessoas que ia do mais devoto ao curioso que ainda nem os conhecia, mas que tinha ido parar ao Tivoli porque o trânsito entre salas - São Jorge, Variedades e Maxime incluídas - assim o proporcionava. Um sentimento algo desconfortável unia esta gente toda: saber onde cada um ficar, perante o dilema etiqueta/paixão colocado por aquele espaço numa noite em que se escrevia história.

Explicando: o Tivoli, casa de outros andanças, condicionava na medida do diminuto espaço entre cadeiras reservado aos espectadores; está mesmo a pedir que a malta fique ali sentada, direitinha, muito atenta, sem dar corda aos ossos. Por outro lado, o momento era de euforia: recebíamos pela primeira vez o quinteto The Walkmen – banda empacotada no chamado indie-rock que trazia na mala alguns temas do recente disco “You & Me”, mas também se preparava para recuperar outros clássicos que fazem as delícias de uma certa fauna que os ama. E queria mostrá-lo. A solução chegaria entre o segundo e terceiro temas do alinhamento, muito naturalmente, sem dramas.

De lata super bock na mão – a dada altura imaginei como seria maravilhoso que um dos cinco músicos da banda tirasse da cartola uma carlsberg -, Leithauser, vocalista, ocasionalmente guitarrista e líder a tempo inteiro dos Walkmen, cumprimentou a malta e abriu o concerto com “New Country”, um prefácio lento, mas espirituoso, do que viria a seguir. Tivoli atento, e sentado, de acordo com a etiqueta. Segundo tema do alinhamento: “In the New Year”; Tivoli em êxtase colectivo, há criançada a chegar-se junto ao que poderiam ser grades de protecção ao palco – não existem -, e entoa-se a uma só voz uma tirada de esperança: “It’s gonna be a good year”. À terceira, com “The Rat”, está a sala conquistada – meio Tivoli de pé tem de significar algum tipo de conquista -, e do jeitinho intimista de Marcelo Camelo (ex-vocalista de Los Hermanos) já pouco resta.

Agora é tempo de sentir o ressoar de canções populares melodramáticas – forma como estes rapazes nascidos em Washington explicam na sua página myspace o que fazem -, que se percebem saídas da era pós-Sex Pistols, confortáveis no terreno dos Joy Division, e que hoje ecoam com as dos National. De não pouco espanto é a estrepitosa voz de Leithauser: regada a duas cervejas e meia garrafa de água durante a hora de concerto, consegue, de alguma forma, fazer-se ouvir quase sempre acima dos instrumentos, naquela forma de soar própria de quem partiu alguma coisa por dentro, ou pretende que se parta noutro lado qualquer.

Erro de casting

À medida que a curta hora de concerto se esgotava, já depois da aconchegante “Canadian Girl” e do inesquecível riff de sete degraus a subir de “All Hands and the Cook”, começou a deserção: era meia noite, e a festa da Liberdade continuava do outro lado da Avenida, com X-Wife no Variedades e, assim se podia ler no programa de bolso, Frankmusic no Maxime - dali até à 01h. Mas nem tudo é como se lê, o que foi possível constatar após algumas indefinições sobre o vindouro e final destino da noite – a propósito, pelo Tivoli andava David Fonseca com óculos cool de psicopata imberbe -, já no antro do senhor Manuel João.

Lá nos esperava a dupla de DJ’S Stereo Addiction, e a verdade é que até nem tinhamos nada contra; a sociedade parecia coerente, um baixava e o outro levantava – depois trocavam -, mas o que nós queríamos mesmo era perceber porque razão não havia sinal de Frankmusic, sendo 00h45, e os da batucada electrónica já ali acampados, com início previsto para a 01h15. Foi depois de me esclarecerem – “ah, esse (Frankmusic) já tocou, acabou mais cedo” – que surgiu a grande dúvida que dali a pouco me perseguiria até casa, e teima em ficar: “Será que os Walkmen foram beber um copo ao Maxime?”

Créditos: A Rita Carmo é a maior, e a malta da reportagem do IOL também; sobretudo o Luis Silva - olho de lince na edição de imagens.

quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

Um Castelo na Escócia Record Awards 2008


Há tanto de inofensivo numa lista pessoal de melhores discos de cada ano como no bafo da Amy Whinehouse ao acordar. Ainda assim:

1. Cut Copy (Melbourne, AUS) – In Ghost Colours
Música de levantar voo, para se ouvir no carro a caminho da festa, e na festa. Ponte belíssima entre rock e sintetizadores pop dos anos 80; canção a canção, só melhora. Um triunfo com eco semelhante ao dos britânicos Klaxons em 2007, e o consagrado "Myths Of The Near Future". Até o nome da banda, que já tinha um disco editado em 2004, tem tudo a ver com o estarmos aqui, e agora.

2. Vampire Weekend (NY, EUA) – Vampire Weekend
Meninos de aspecto lavado, com um pé na curvilínea pop africana e outro no punk-rock à desgarrada. Por eles engolimos pó durante uma hora, a 10 de Julho, quando se estrearam em Portugal na tenda do Optimus Alive! 08, dia um. Dá para ouvir o albúm de estreia num só fôlego se entrarmos na estação de metro Amadora-Este e sairmos na do Oriente. E de tal forma esses 40 minutos passam num instante que, olhem, já passaram.

3. Los Campesinos! (Cardiff, GB) – Hold on now, Youngster…
Aqui celebra-se a separação de ego e juventude num festim tal que ninguém vai ter tempo de se lembrar da idade ou dos sinais de pontuação do sistema ortográfico porque aquilo que a malta destes tempos verdadeiramente quer é rock pujante com sininhos.

4. Ra Ra Riot (NY, EUA) – The Rhumb Line
Percussão nervosa, a fazer lembrar a batida cardíaca de “Boxer”, dos National, à qual se junta uma espantosa sociedade entre violino e violencelo; puro deleite barroco, não aconselhável a pessimistas.

5. MGMT (NY, EUA) – Oracular Spectacular
Sonoridade andrógina, exemplo pródigo da geração myspace que tudo funde em prol do caminho para nenhures, rodeado de flores e substâncias psicotrópicas, onde tudo vai bem.

6. dEUS (Antuérpia, BEL) – Vantage Point
Alta-costura, discreta, que não comove de entrada, finíssima, menos ruído de cordas elétricas a conduzir os temas, uma velocidade a menos: assim vai o último disco destes belgas, um daqueles à antiga; vai-se gostando cada vez mais, aos poucos, até nos apercebermos que só lhe demos tempo porque cá dentro já há território marcado.

7. The Kills (Londres, GB) – Midnight Boom
Rock n’ roll, baby.

8. Coldplay (Lon, GB) – Viva la Vida or Death and all his Friends
(É certo que cada canção tem o seu piano a entar de mansinho, depois a voz em falsete debaixo dos lençóis para ninguém ouvir, junta-se a bateria, seguida de um coro de estádio, a coisa vai crescendo, progressiva, até à grande explosão, e depois regressa aos poucos, a planar, como quem vem da festa - mas, que diabo, estes tipos são mesmo bons).

9. Silver Jews (Tennessee, EUA) – Lookout Mountain, Lookout Sea
David Berman ensina ao menino e à menina como ironizar o coração: por vezes dá jeito. Guitarra acústica em punho, dispara histórias sobre o folclore norte-americano e ra-ta-ta-ta, tudo rendido.

10. Yeasayer (NY, EUA) – All our Cymbals
Sonoridade tribal, a descer, lenta, do imenso espaço. 2080 é uma das músicas do ano.

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10 melhores da Uncut:
1. Portishead – Third
2. Fleet Foxes - Fleet Foxes
3. TV On The Radio - Dear Science
4. Bon Iver - For Emma, Forever Ago
5. Vampire Weekend - Vampire Weekend
6. Elbow - The Seldom Seen Kid
7. Neon Neon - Stainless Style
8. Nick Cave & The Bad Seeds - Dig!!! Lazarus, Dig!!!
9. Kings Of Leon - Only By The Night
10. Paul Weller - 22 Dreams


10 melhores da Blitz:
1. Portishead - Third
2. Hercules and Love Affair - Hercules and Love Affair
3. Silver Jews - Lookout Mountain, Lookout Sea
4. TV On The Radio - Dear Science
5. The Kills - Midnight Boom
6. MGMT - Oracular Spectacular
7. Vampire Weekend - Vampire Weekend
8. American Music Club - The Golden Age
9. Bon Iver - For Emma, Forever Ago
10. Erykah Badu - New Amerykah: Part One (4th World War).

Créditos: o senhor picasso é o maior.