segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

É preciso seguir esta mulher



Se uma das guitarristas do Robert Palmer no vídeo da Addicted to Love fosse inglesa e tivesse uma filha com um italiano e ela nascesse com olhos de pantera e a voz da maria callas.

quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

Montenegro

A minha bisavó benzia a constipação, o pé torcido e o mau olhado. Ou quebranto, como se ouvia em Quatrim do Norte, onde morava com a minha avó e a minha mãe há tanto tempo como viveriam dois de mim. A localização da fronteira entre Quatrim do Norte e Quatrim do Sul gerava algum debate, na medida em que ninguém se tinha lembrado de a demarcar, mas a minha bisavó Tanta, nome que o meu irmão mais tarde lhe colocaria por ter dificuldades em pronunciar o que de baptismo lhe deram (Firmina), sempre soube que era mais cansativo voltar a casa vinda de qualquer outro sítio do que o contrário. Residia no cimo da rua. Por aí era Norte; em baixo, Sul.

A fama de curandeira chegava, dizia-se, até Olhão. Coleccionava outras virtudes, como o entendimento à distância das coisas e o apego à costura, faculdade que viria a ensinar com aprumo à minha avó Vivi, nome que lhe coloquei por ter dificuldades em pronunciar o que de baptismo lhe deram (Vitalina), mas foi a de livrar as pessoas dos mais variados infortúnios que fez o seu nome correr de boca em boca. Fazia uso de tais qualidades sobretudo a favor da família, mas não fechava a porta de casa a quem vinha de fora: várias foram as vezes em que amizades da terra foram recebidas na sua casa com bolinhos e chá, que saboreavam num silêncio reverente antes do processo que lhes levaria à cura. A minha bisavó Tanta aceitava tais visitas de bom gosto, e não o fazia a troco de dinheiro, mas era frequente ver o candidato à cura aparecer-lhe com um sorriso desesperado e uma garrafa de azeite. Naquele tempo não havia dinheiro, explicará qualquer pessoa que tenha passado a infância de rabo para o ar numa horta. Salvo seja.

Certo dia a minha mãe torceu o pé. As dores eram fortes e ela chorava no momento em que explicava à Tanta que se magoara ao descer de uma árvore. Atenta, esta deu-lhe bolinhos e chá e depois de ver o repasto em silêncio da bonita neta pediu que fosse para o quarto e se deitasse na cama de barriga para cima, como mulher em consulta de gravidez. Obediente, assim fez a Maluquinha, nome que coloquei à minha mãe porque sem dúvida o merece. Depois a Tanta fez-lhe aterrar um pequeno pedaço de pão no peito e benzeu-se com o sinal da cruz:

Em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo.

De pronto fez que passava uma agulha numa linha, como quem coze, e anunciou.

Eu cozo.

A Maluquinha acenou que sim, vendo que não, e respondeu: 

Carne quebrada, nervo torto, eu cozo pelo direito e a virgem pelo torto.

Nove vezes repetiu a ladaínha com o pé em cima de um pau de vassoura, movimentando-o para a frente, mas também para trás. Depois a Tanta untou-lhe o pé com toucinho quase estragado para no fim deitar fora o pedaço de pão e arrotar com vontade, de modo a melhor espantar as más energias. E que não estivesse eu com cara de fazer pouco, avisou-me a Vivi, suportando com a expressão séria da certeza a tese de que assim mesmo a mãe lhe curara a filha.

Estas e outras coisas me contou a Vivi no sábado, sentada ao meu lado num café em Montenegro, arredores de Faro, enquanto atacava metade de um croissant misto. Minutos antes, quando chegámos àquele povoado, fiz saber à Vivi que Montenegro era nome de país e perguntei-lhe se sabia onde ficava. Confiante, respondeu-me: “Sei, é na serra.”

quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

A banda dos cavalos merece (e terá) outro público na Aula Magna



Como a miúda do liceu a quem nunca falaste porque eras palerma, preferiste correr atrás de uma bola e esfolar os joelhos em vez de a perseguires depois de tocar para a saída, um beijo em troca de um estalo, os Band of Horses têm aquela capacidade perigosa de roubar o ar em teu redor. É uma aflição.

segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

Mais respeito pelo Real, menos pelo Mourinho



Aprender é um processo que nos deixa confusos antes de esclarecidos e melhores. Hoje aprendi a respeitar mais os adeptos do Real Madrid. O clube, portanto. Passo a explicar: esta noite o Villareal levou 4-2 no Bernabéu. Esteve a ganhar duas vezes na primeira parte. Jogou muito e bem. Teve o Real à mercê. Não conseguiu dar o golpe final. E o Real, sobretudo este, liderado pelo Mourinho e com o Ronaldo nos limites do potencial humano, é uma besta insaciável. Se te distrais ela devora-te. E lambe os dedos. Prazer completo com reflexo perfeito no CR7 - três golos, uma assistência e uma fome de glória sem limites. Perito nessa arte de lamber dedos, o Mourinho resolveu voar do banco branco após o último golo, do Kaká, e aterrar em celebrações à frente do banco amarelo, atrás do qual estaria, garante, o filho. Que por ele o jura. Por isso festejou ali, na área técnica do treinador adversário, que durante a semana o elogiara até à exaustão. Só por esse motivo. O resto são conspirações. O mundo contra o Mourinho. Médio de ataque de 29 anos do Villareal que joga um portento e marcou o primeiro golo do jogo, o Cani não gostou dos motivos do especial e tentou acertar-lhe no lombo com uma garrafa de água. Vai festejar para a tua casota, era a mensagem. Foi expulso, mas falhou o alvo, com muita pena de todos os adeptos do Real Madrid - leram bem - que tinham comentado as cinco primeiras páginas da caixa de comentários do As sobre a notícia da expulsão do Cani. Sim, o treinador consegue títulos onde quer que passe. No que toca a resultados é o mais capaz. Mas não pode valer tudo e por isso há demasiada gente, eu incluído, que já perdeu a paciência para encontrar combinações de contexto que desculpem o comportamento do desportista. E o Real Madrid sempre foi um clube de desportistas. Grandiosos desportistas. Não estou a ver como é que o Mourinho vai passar por cima disso, cultivando ódios em todos os estádios, a tudo sendo perdoado, todas as vezes.

segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

Reflexão inspirada em muitas coisas, umas mais que outras


O mais alto responsável do Sindicato dos Amantes subiu ao púlpito, corrigiu a voz para um registo de imperador e declarou: "O amor voltará a ser exagerado. Pouco razoável. Ruidoso. Fará cenas em público. Será objecto de traição e vingança. Certamente de uma ou outra tragédia. O amor vai desmaiar de prazer antes de esboçar o mais pequeno raciocínio de auto-repressão. O amor será apanhado em flagrante no elevador, borrando cantos de boca e desfraldando camisas. O amor será apalpado na fila do supermercado. Será uma canção do Barry White. O amor será amado pelos amantes até se esvair em choro e ser trocado. Mandará o conforto à fava. O amor terá cabeças encostadas com olhos a raiar de vermelho-fúria revirando pelas órbitas numa sintonia doida-varrida. O amor fará elogios foleiros. O amor insinua-se por trás e beija no pescoço. Dispensa roupa. Palavras. O amor toma o piropo por elogio e devolve com um ziguezague de ancas. O amor responderá que sim mas fará exigências. É possessivo. O amor vai telefonar mais do que duas vezes – sete, setenta, as que forem necessárias até que o atendam fodass. O amor não faz fretes nem greve. Trabalhará por gosto até desaparecer. E uma vez terminado continuará ciumento. Egoísta. Soberbo."

domingo, 2 de janeiro de 2011

Um Castelo na Escócia Record Awards 2010


(após breve espreitadela à bola de cristal do professor bambo)

20. Before Today, Ariel Pink's Haunted Graffity
19. Small Craft on a Milk Sea, Brian Eno
18. This is Happening, LCD Soundsystem
17. King of the Beach, Wavves
16. Forget, Twin Shadow

15. Brothers, Black Keys
14. Halcyne Digest, Deerhunter
13. The Monitor, Titus Andronicus
12. Innerspeaker, Tame Impala
11. Astro Coast, Surfer Blood

10. The Wild Hunt, The Tallest Man on Earth
9. Swim, Caribou
8. Lisbon, The Walkmen
7. The Suburbs, Arcade Fire
6. From the Cradle to the Rave, Shit Robot

5. High Violet, The National
4. My Beautiful Dark Twisted Fantasy, Kanye West

3. There is Love in You, Four Tet

Música de dança para corpo e mente.

2. Teen Dream, Beach House

Para nos perdemos de paixão.

1. Congratulations, MGMT

Uma rara declaração de talento e liberdade.