quinta-feira, 27 de agosto de 2009

É sempre de ouvir em repeat # 40, 41 e 42



jj é doce ao primeiro ao contacto. Há um EP do bicho. E ninguém sabe quem o bicho é.



Estas teclas perseguem-me o dia todo, e podia agora mesmo fazer uma analogia com melgas, dada a perseguição, mas não faria grande sentido porque, enfim, até a bióloga mais querida se deve sentir realizada quando esmaga uma.



Pela amostra, muito cuidadinho com o novo disco do projecto com o melhor nome do mundo, e arredores. (Agradecimentos ao oráculo do costume).

terça-feira, 25 de agosto de 2009

Volta ao Minho, dia três

09:00 é muito cedo para mim, é mesmo, e agora lembrei-me que ela é, ou era, a cara chapada da vocalista dos Texas, lembrei-me do quanto me desorganiza querer colar os calcanhares ao rabo antes de dormir para os primeiros escorregarem lentamente até à posição muito direita do morto, ou o mosquito que goza comigo há duas noites sem que o consiga apanhar, daí escrever o relato do terceiro e último dia no Minho já hoje, a ver se o encontro aqui por cima, desprevenido, o cabrão, mais esperto que sei lá o quê. Confiámos no GPS para rumar ao Gerês. Um erro aqui, outro ali, mas foi-nos bem útil. O Ricardo acha que eu me comovo com o óbvio, e tem 97,7% de razão. Uma língua torta de azul límpido entre montanhas e clique, clique - o tolinho age como se nunca tivesse visto tal coisa. 2% dos 2,3 que faltam cabem no cartaz da oficina da Citroen de Viana do Castelo. Os outros 0,3 entram nas lagoas que encontrámos Gerês acima, até à cascata de Portela do Homem, na fronteira. Tão acima que, salvo melhor solução em território português, estacionámos em Espanha, na Serra do Xurês, regressando a pé cerca de um quilómetro ou dois para enfiar a pata nas águas cristalinas, quase frias, do rio Homem. Andar por ali, de rocha em rocha, apenas para ver de perto um rio entre pedregulhos que se despenha numa lagoa é claramente estúpido, tal o perigo - uma miúda espanhola escorregou numa réplica da cascata maior e, bem, ouch! Mas nós, animais extremamente racionais, fazemo-lo à mesma, que só se vive uma vez e aquilo é giro à brava. A estrada que nos levou a Portela do Homem era tão sinuosa, tão íngreme, que arriscámos dar a volta pelas belíssimas estradas galegas rumo a Paredes de Coura, onde, como há um ano, estava agendado novo jantar na casa da família do Sr. Carlos, dono da cervejaria Solar dos Mouros, ali nos primeiros metros da Calçada lisboeta do Poço dos Mouros. Chegámos ao sítio de Chão, onde o Sr. Carlos mora, já com o Sporting a perder com o Nacional. A viagem foi longa, umas duas horas?, e, na verdade, o clube que por estes dias só me dá alegrias esquisitas não precisa de muito tempo para ficar atrás dos outros. O amor é fodido, já diria o MEC. Como na cervejaria, a Dona São, mulher do Sr. Carlos, apostou em fazer churrasco para um regimento de infantaria. Come mais Rui, olha tanta comida. Pois isso vejo eu Dona São, já azul, olhando de ladeiro para o Sr. Carlos, que nunca me deixou ter o copo vazio de Alvarinho verde branco - o suspeito do costume. A Carla, filha, ia para Ponte de Lima ver Daniela Mercury. Com o assentimento do Ricardo, a Célia acha que eu me ando a fazer à mocinha. Não percebo. Seguindo o rasto de Colin McCarlos, já com uma sarda considerável, descemos e subimos e curva contracurva até Sapardos, onde a grande festa anual de Nossa Senhora de Fátima atraía centenas de casais que ali chegavam em carros de matrícula francesa. As mulheres, pintadíssimas; os homens, de patilha fina em diagonal e cruz dourada ao pescoço. Cabeças de um cartaz monocéfalo: Função Publika, pois então. Com vários membros novos, entre os quais um argentino chamado Carla, esta big band teima em arrastar multidões no querido mês de Agosto. Covers de Bombocas, Queen e Roberto Leal fizeram parte de um repertório versátil, como a enumeração adivinha, mas não esgotaram um espectáculo farto em surpresas. "Vamos oferecer uma bengalazinhas cintilantes e uns balõezinhos amarelos de borracha", anunciou, de repente, um membro espanhol da banda, elevado numa plataforma que apareceu no meio do público, tal como em 2008. Porra, pensei, feliz, isto é Portugal! O fogo de artifício que interrompeu a actuação meteu os narizes em sentido e colheu aplausos apoteóticos. E nós, já depois de o Sr. Carlos, escapando à mulher, me ter levado por um braço para beber um último copo, mal sabendo eu, zonzo de tanta coisa junta, que este seria de penálti, voltámos a Antas, Esposende, que havia um comboio para apanhar no Porto pela manhã. Dormi - tentei dormir - quase uma hora sentado, não fosse a bílis tecê-las. Um punhado de horas depois já me encontrava na redacção, sentado em frente a um computador, tac tac tac num domingo sem pessoas. A tradição ainda é o que era.

segunda-feira, 24 de agosto de 2009

Volta ao Minho, dia dois

09:30 é muito cedo para mim. Quem também se orientar por um horário de trabalho de vampiro que se sente ao meu lado. Daí que me tenha sido doloroso o despertar do corpo, não tanto o da mente, quando o telemóvel chateou. (O telemóvel é uma dor no rabo, diriam os ingleses). Destino: Castelo do Neiva. Um intenso fedor a estrume recebeu-nos antes da chegada a um areal quase deserto. O exacto oposto do que foram 12 dias no Algarve. O equilíbrio desejado - dispensava era o perfume. Castelo do Neiva. Para outros lados não se podia, observou a voz da razão. A areia naquela zona é mais espessa do que aquela a que me habituei, mas nem por isso notei diferenças quanto à temperatura da água. Esperava um ataque furioso de lâminas afiadas e eis que se mergulhava sem especial dor. De passagem por casa para um almocinho light - salada e douradinhos - depressa partimos para Viana do Castelo rumo à Citroen. Para quem nunca valorizou especialmente o potencial de sedução desta empresa, aqui fica a minha sugestão: roda batida para a oficina de Viana e mãos em baixo quando se depararem com o cartaz que se encontra estrategicamente afixado na parte de dentro do vidro de um dos escritórios de atendimento, com o que interessa virado para fora. Depois fechem os olhos e sintam a coisa. Feita a revisão ao carro, seguimos viagem para uma caracolada. A ideia inicial era rumar até à casa de pasto Os Telhadinhos, em Ponte de Lima, onde a ementa nos acena com iguarias tão irresistíveis como fodinhas quentes (pataniscas de bacalhau), mentirosos (bolinhos de bacalhau que, é certo e sabido, têm mais batata do que bacalhau) e, claro, corninhos de marcha lenta (caracóis), mas ficámo-nos ali perto, por Viana, no Diplomático. A condizer com o nome, o Diplomático tem empregados extremamente correctos, mas a cozinheira fala pelos cotovelos. Quando esta reparou que a Célia, namorada do Ricardo, não estava a dar o palito à corda tantas vezes quanto isso, veio até junto de nós para saber os motivos de tamanha timidez. Até estou a comer bastante, replicou a Célia, apontando para os três ou quatro caracóis vazios que já tinha espalhado pela loiça. A Célia não gosta de caracóis. Três ou quatro era mesmo um (justificado) elogio. Deixámos o horizonte engolir o sol na companhia de dois amigos do Ricardo: o Manuel Iglesias, que lutava com muita droga previamente prescrita contra uma infecção no estômago, não podendo por isso beber durante três meses, e o amigo discreto, de aspecto nórdico, que era mesmo discreto, de modo que nada sei dele. De seguida, arroz de cabidela. Não dá para comer assim a coisa com arroz normal? Aquela pasta de sangue, só de pensar.. dá, não dá? Deu. Gente boa. Misturei-o só com o molho da carne, para não ficar tão branquinho, pelo menos, a destoar tanto. E o vinho, bem, o vinho estava divinal, como sempre, mas menos fresco, o que se nota. Alvarinho, salvo erro, tal como no jantar da última noite, já na típica localidade de Chão, Paredes de Coura, Cruzes Credo, onde tudo acaba. Antes houve copo e paleio em Viana do Castelo, num bar que eu pedi que fosse de rock e vá que tinha reggae, e olha que bem fixe, algumas horas de sono e a visita possível ao Gerês, em contra-relógio. Aviso do Ricardo: amanhã é para levantar cedo. Cedo?, desesperei. Mas, mas, cedo até que ponto?

sexta-feira, 21 de agosto de 2009

Volta ao Minho, dia um

Vai para cima de uma dezena de anos que Espinho é passagem. Longe - tão longe - vão os Verões passados no pátio de um apartamento mesmo em frente ao liceu, no topo da cidade, que é uma colina grande e urbanizada, e as idas e vindas a pé com o meu primo Pedro até à praia e ao gélido mar de Espinho, eu e o meu primo Pedro a fazer disparates a caminho da praia de Espinho com o Guilherme, que jogava hóquei em patins, e nunca com a Joana, que me deu 100 escudos em troca de um beijo. A minha primeira experiência como prostituto gerou trauma cá dentro: a Joana não tinha culpa, mas era muito feia. Fins mais altos, porém, se levantaram - a vitrina de uma pastelaria ali perto da casa do meu primo. Com o estômago a sofrer e a hora de jantar distante, fiz o sacrifício. Teria uns dez anos. Nunca mais fui o mesmo. Agora Espinho é só passagem. E de comboio, como mais gosto. Foi uma das últimas cidades por onde passei no meu sortudo roteiro de quinta-feira 13, quando varri o país num dia. Às 12:00 no Algarve; às 20:00 no Minho. De carro, primeiro, entre Portimão e Lisboa. De comboio, depois, entre a capital e o Porto, onde me esperava o Ricardo, que depois me levou até à casa onde cresceu, em Esposende. Um ano depois voltei à casa da mãe do Ricardo, aos cozinhados da mãe do Ricardo, à simpatia da mãe do Ricardo. E à família da irmã da mãe do Ricardo, que, nem de propósito, vive na casa ao lado. Localizada em S. Paio de Antas, concelho de Esposende, a casa da mãe do Ricardo era uma coisa antes de ser construída a auto-estrada que lhe passa por cima. Vá, um bocadinho ao lado. Agora é outra. Jantando no terraço ouvíamos de vez em quando o chiar das guias sonoras, aquelas linhas brancas sem fim que nos dizem, Abre a pestana, quando esta teima em fechar. Estará tudo maluco?, pensei. Tanta chiadeira junta, tudo no mesmo local? Explicação: os amigos da família passam ali para se meterem com eles, que é o mesmo que dizer Olá na linguagem muito própria dos carros. Niiioounnnn. Nioun para ti também. Depois de metermos a conversa em dia sobre um arroz de peixe empurrado a vinho verde fresco, fresquíssimo - só melhora - e de ter conhecido o Quique, uma caturra que canta e encanta, segundo me tentou convencer o clã Saleiro, não tendo eu porém ouvido mais do que o esganiçar de cria de gaivota, perto do que um amigo meu entoou há dias ao arriscar o Stayin' Alive dos Bee Gees no karaoke do Boogie Bar, esse trampolim para a fama reservado aos grandes talentos. Fomos a Esposende beber um copo. Espaço escolhido: Pé no Rio - ou Penúrio, como a proximidade entre letras sugeria, ou Penúrias, como depressa lhe baptizei. O Penúrias tem todo o aparato de ser o bar mais bonitinho da zona, com música ao vivo no interior e uma esplanada muito moderna, com wireless e puffs. Mas era lá dentro que tudo se passava. Liderado por uma vocalista de nome Mónica Coelho, um quinteto revisitava projectos como Bryan Adams, Pink Floyd e até deu uma perna num fadinho. À segunda caipirinha - três euros, esperava outra multa, gostei - ouvi a cantora chamar um casal à pista de dança e dedicar-lhes uma espanholada qualquer. De não pouco espanto foi vê-los a dançar como verdadeiros profissionais. Provavelmente porque o são, pensámos, depois de os ver junto de outros casais que tais a ensaiar novíssimos passos de dança a cada música seguinte. Tudo sem falhas. Um longo bocejo. Era parte do staff. E aplaudiam em apoteose cada solo de um músico. E perfaziam entre si quase metade da lotação naquela noite. E dois terços da festa. E nós com uma dúvida: seremos os únicos a perceber isto? Não regressámos a casa sem que antes eu tivesse apanhado a grande desilusão da viagem. A árvore no meio da estrada. Fotografei-a em 2008 na certeza de que estava perante um monumento de rara beleza. A natureza a ser quem mais ordena. Agora, caput. Menos mau que deixaram as raízes, e a estrada já está lentamente a empinar. Entretanto, aviso do Ricardo: amanhã praia. É para levantar cedo. Cedo?, desesperei, Mas, mas, cedo até que ponto?

quarta-feira, 19 de agosto de 2009

1692

A maresia cumpre com nota máxima o seu papel de despertador mais eficaz de Portimão. Diferente de outras cidades, onde este odor é elogiado - 'ah!, o cheiro a maresia'.. -, na minha tem o fedor acumulado de casca de banana a viver há quatro dias num cestinho do lixo com aquele que deve emanar dos cadáveres em decomposição. Na madrugada de 13 de Agosto anunciou-se pelas janelas abertas da cidade antes da alvorada, pilhando o sono a quem ainda o procurava ou, verdadeiramente, nunca o teve. Para o que esta história interessa, eu, menino, que nunca prego olho antes de viajar a menos que me canse à séria, entro no grupo dos primeiros. Do meu quarto, na minha cama, revirando-me numa noite de calor demoníaco, cheirou-me a ataque químico. Um exagero sem explicação, à medida de tudo o que por ali mexe em Agosto. Como hoje a conheço, a maresia de Portimão pode muito bem justificar o temperamento neolítico dos que por estes dias chegam à cidade. É um fedor de enlouquecer, que não se pode, e que me dá ideias sobre uma chegada a Nápoles depois de ler o Gomorra, do Roberto Saviano. Como tenho por hábito fugir da cidade nesta altura do ano - faço-o desde 2006 -, encurtei as minhas férias em família e apontei para norte. Horas antes, na minha última refeição das férias em Portimão, jantei num refúgio ali a uns 20 quilómetros serra dentro. Paragem: Caldas de Monchique. A resposta ideal para quem chega ao Algarve em busca de sossego. Era o meu caso, depois de 12 noites e poucos dias. Situadas no coração da serra, a cinco quilómetros de Monchique, as Caldas são a única estância termal do Algarve. Ali o cheiro é outro: vegetação, ar puro. Diz-se que por ali mora a maior magnólia da Europa, e eu, claro, esqueço-me sempre de a procurar. Come-se, bebe-se e paga-se bem no restaurante 1692, que deve o nome aos primeiros registos de utilização pública daquela água termal. Quando o tempo ajuda é na esplanada que se deve jantar. De entrada atropelámos um queijinho amanteigado daqueles que só na serra. De saída foi à bruta: pão com chouriço caseiro, genuíno. Dá-se o caso de que, em certas casas, não demasiadas, o pão com chouriço tem mesmo chouriço. E sabe a chouriço. Pelo meio demorei-me num bife à portuguesa que me esqueci de fotografar, e para o empurrar socorri-me de um Quintas do Douro, very white, de 2007. No fim uma amêndoa amarga - sem limão, por favor, que eu gosto mesmo é de como a amêndoa sabe. Para o fim, a cereja: sessão de cinema ao ar livre - é a lei às quartas-feiras (quartas-feiras ou quarta-feiras?) de tempo simpático. Desta vez passou o Vicky Cristina Barcelona, do Woody Allen, a partir das 21:30. Houve quem, acto contínuo, travasse a sua refeição a meio para assistir ao filme. Podiam atrasar a projecção uma meia horita, rendia mais, digo eu. Bottom line: recomendadíssimo.

terça-feira, 18 de agosto de 2009

Vou contar-vos uma história de amor

Para quem desconhece, a melosa é uma das melhores coisas que o Algarve algarvio tem para oferecer, naturalmente a seguir ao convívio com a minha avó, a Vivi. Juntar as duas entre dois dedos de conversa na digestão de uma refeição foi, até ao último dia 10, um dos meus objectivos mais dignos de vida por realizar. Concretizei-o, entretanto, por ocasião do jantar de aniversário do meu irmão. Como a conheço, a melosa nasceu na serra de Monchique, sabe bem que se farta, bate que é bonito e, last but not least, deita por terra a mais teimosa das constipações. A preparação é simples: meio litro de água no fogo azul com 500/600 gramas de mel, uma casca de limão e um pau de canela. Quando a mistura ferver contem até mil, sem grandes pressas. Arrefecido o combinado, juntem-lhe meio litro de aguardente de medronho e depressa perceberão o que é bom - estupidamente bom! - para a tosse. Um cálice é óptimo. Dois soa e sabe melhor. Mas a minha avó, que, sabe-se lá como, nasceu ali para os lados de Olhão há mais de 82 anos e não fazia a mais pequena ideia do que vinha a ser isso da melosa, virou três depois de se ter encantado com o primeiro - este a pedido da família Coelho. Só pela excitação que lhe causou a primeira investida, a Vivi derrubou pela mesa, ao segundo trago, o que dele sobrava. 'Ai que pena que tive, isto soube-me tão bem', deixou escapar, desolada, ao ver o líquido espalhado na toalha. Refeita do percalço, que o mundo não acabava ali, só parou de virar copinhos quando o dono do restaurante fugiu com a (já levezinha) garrafa para dentro da copa, assustado com a sede dos Coelhos, a quem vinha oferecendo cálices de quando em quando, o que, pareceu-nos, só lhe ficou bem. Até se deitar, pela primeira vez em muito tempo, a minha avó esqueceu-se das dores na coluna que todos os dias a curvam um bocadinho mais. Dormiu bem, acordou melhor e prometemos-lhe a garrafa 'com aquela coisa muito boa' que pediu com o sorriso bobo que tinha quando a coluna não a chateava. O prometido é devido.