"The only people for me are the mad ones, the ones who are mad to live, mad to talk, mad to be saved, desirous of everything at the same time, the ones who never yawn or say a commonplace thing but burn, burn, burn like fabulous yellow roman candles exploding like spiders across the stars." J. Kerouac
sábado, 20 de setembro de 2008
Acham que já leram tudo e nada vos choca?
George Bataille certamente teria a sua visão muito única do mundo. Percebemo-lo às primeiras ideias de “Story of the Eye” (1928), um visceral ataque aos sentidos do leitor, que é convidado a acompanhar as aventuras sexuais de dois adolescentes desesperados por escapar ao grande bocejo quotidiano. Mono divinal, trapezista entre as margens do lixo e da arte, caiu nas boas graças do Jean-Paul Sartre e consta ser o livro favorito da Bjork. Mete ovos, leite e testículos de touro. E mete também tudo isso em que estão a pensar, e onde estão a pensar, mas de uma forma que não tolerariam projectar. Cheguei até ele porque é referido num verso do estonteante épico “The past is a grotesc animal” (Hissing Fauna, Are you the Destroyer? - 2007), dos norte-americanos of Montreal. Não me lembro de um livro mais inapropriado para recomendar. Naturalmente que passou pelo século XX em surdina. Nojento, bizarro, doentio. Li-o de uma assentada. Não o façam a menos que se entendam parcialmente desequilibrados, e queiram ver até onde é possível este autor francês chegar. De contrário, confiem em mim: o mais provável é que o abandonem antes do virar da primeira página. Seria compreensível. É que esta sinopse tem muito mais de eufemismo que de exagero.
quarta-feira, 17 de setembro de 2008
Para português aprender
Quantas vezes Steven Gerrard já ganhou jogos para o Liverpool? Quantos remates vitoriosos para figurar nos achados de compilações anuais já sairam dos seus pés? Quantos festejos mutuamente devotos junto dos adeptos “reds”, quando o relógio tiquetaqueava para o final do tempo regulamentar e a vitória não aparecia?
Terminado o ruído balnear em torno da hipotética transferência de Moutinho para o Everton, lembro-me de uma considerável legião de médios-centro que fazem o mesmo pelos seus clubes, desde sempre; marcam golos, decidem jogos. Xavi, Lampard, Pirlo, Ballack, Sneijder, Fàbregas. Finda essa viagem, rememoro no caminho de volta mais uns quantos, bem familiares - Deco, Lucho, Maniche -, e regresso àquele que hoje, em Marselha, voltou a provar ser, possivelmente, o melhor de todos. Como se precisasse. Ninguém ouvirá este rapaz dizer que nada tem a provar – anúncio veiculado por muito craque nos dias que correm, e que Moutinho achou por bem recuperar na abordagem ao jogo desta noite, em Barcelona. Gerrard tem outras ideias, e sustenta-as dentro de campo, pelo meio e ao fim da semana, tenha pela frente o Marselha, Middlesbrough ou Milan.
Enquanto o pequeno João não ganhar o hábito de fazer algo que tenuemente se assemelhe a isto, permanecerá confinado à dimensão de um jogador irrequieto e dotado das melhores intenções. Faltar-lhe-á sempre aquele "bocadinho assim" para entrar no lote de jogadores acima identificado, e ao qual há muito se vaticina vê-lo chegar.
quinta-feira, 11 de setembro de 2008
A Beira Alta pariu um diamante
Aquele querido mês de Agosto, de Miguel Gomes
Miguel Gomes quis muito ser português num plano: um dos últimos, onde filma de perto um lençol sarapintado ao primeiro encontro de ventres; entende-se a bisbilhotice na medida em que já o filmara, de outro ângulo, no plano anterior, depois de ter explicado ambos, previamente, quando o jovem protagonista, ladeado nos lençóis pela sua congénere feminina, rebolou para cima desta embalado pelo optimismo vespertino. “Oh, que exagero!”, exclamou alguém, chocada, algures na plateia – bem me contorci por decifrar o ícone, mas em vão -, com a doçura que uma gargalhada generalizada posteriormente anunciou.
Para trás, e no pouco que faltava até ao tombar dos créditos finais, fica uma caldeirada bem portuguesa de canções, triângulos amorosos e emigrantes quadrados que circunscreveriam com a mesma harmonia geométrica uma sala em Cannes ou Arganil (por arrojado que seja imaginá-las na localidade beirã). Para rememorar os clássicos da música ligeira portuguesa – ah, Marante! –, juntamente com a fauna do King, no que é um tremendo naco de cinema português, toca a reunir para ver “Aquele Querido Mês de Agosto”.
segunda-feira, 8 de setembro de 2008
Wasser
Ela estranhou, não acreditou
Disse que não, não era assim.
E então exclamou:
“Ele fugiu!
Cantando o amor, descia o rio.
E assim partiu, não mais se viu.”
E agarrou-se, sem certeza,
Sem nobreza, sem apreço
A outro copo, novo berço.
Soluçou, baixinho.
E acompanhou, e dividiu.
Projectos mil e o recomeço,
Com o violino, errante
Salvou o amor, a cada ano,
Na guitarra, ou no piano.
Venceu a dor, lancinante;
Perder a mãe, depois do amante.
08 Novembro, Guimarães - Centro Cultural Vila Flor
09 Novembro, Sintra - Centro Cultural Olga Cadaval
quinta-feira, 4 de setembro de 2008
Comédia italiana: víuva, mas alegre
Il Vedovo, de Dino Risi (1959)
Foi com o coração nas mãos que João Bénard da Costa, director da Cinemateca, introduziu ao pouco público que ganhou a noite de terça-feira para assentar na sala Félix Ribeiro, pelas 21h30, o primeiro de sete filmes incluídos num ciclo não integral de homenagem ao realizador italiano Dino Risi.
Largas vezes esquecido quando mencionados os nomes que construiram a idade de ouro do cinema transalpino – anos 40 a 70 -, Risi apresenta-se ao público português tão tarde quanto o título póstumo pode significar em si mesmo. Deixou o Grande Circo em Junho deste ano, mas regressa a nós já nos primeiros passos de Setembro, na rentrée da Cinemateca após o habitual retiro de Agosto. Fá-lo com "Il Vedovo" (O Víuvo Alegre, 1959), comédia negra exibida numa cópia não legendada, mas de qualidade superior a toda a linha.
Há um nó a enlaçar a trama logo na cena inicial: travelling lateral acompanhando o diálogo andante de Alberto Sordi, que aqui faz de Alberto Nardi - figurinha do pós-Guerra miserabilista, optimista de meias esburacadas, projectos dantescos e conduzido, chaffeur incluído, num mini adorável, a quem a vida, bingo, não está fácil -, com o seu "braço direito", o “Marquês”, protótipo do italiano desenrascado que luta pelos cacos do desenvolvimento económico numa sociedade pós-deprimida; por eles, à semelhança de uma certa fauna que integra, tudo suportará.
Teor da conversa: Nardi conta em que medida se viu, num sonho, a ficar víuvo por vontade própria. Falta-lhe dinheiro e uma assinatura da mulher, aval necessário à formalização de um projecto que lhe renderia muitos zeros de liras, à direita. Ela, crendo-o megalómano e cretino, nega fazê-lo. Solução: matá-la, e ficar com os zeros.
Raras vezes surpreende, raras vezes aborrece: esta divertida comédia (o que nem sempre, coiso, não é?) que vive à base de esquemas montados para disfarçar uma narrativa cedo desmascarada, já valeria a pena só por - agora víuvos de Risi - nos carimbar um sorriso tonto no rosto, a caminho do metro.
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