quinta-feira, 25 de agosto de 2011

Unspoken



Comentários no YouTube a esta faixa do melhor DJ do mundo (que o Nicholas Jaar fale agora ou se cale para sempre).
 
• "Helps my heart heal"
• "masterpiece"
• "I feel like my Heartbeat needs dillutin'!!! - Plain Beautiful........Could make Satan grow a set of Wings!!"
• "if god wrote this song then who's running heaven?"
• "De las canciones más orgásmicas!"
"what happens when you listen to it more than once a day?"
"that's fucking deep man, just made me cry a little.."
• "oh.... wow."
• "this shit blows my mind"
• "this is the best song by him, in my opinion"
• "sad that music like this never gets to peoples ears"
• "Four Tet is a genius... This song travels my mind into distant worlds, and after it ends, i start feeling a huge void... And i need to start it again, and again..."
• "9 Minutes & 30 seconds of bliss, but still years too short"
"Reality bends when i listen to this song"
• "I dont know whether to laugh or cry"
• "this is just straight fuckin' sick"
• "best 10 mins of my day."
"I'm trippin balls"
• "everyone needs to listen to this song"
"speechless"

quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Éden

lady in red @ Éden
A R. e eu inventámos o conceito de amantes de festivais. Acontece sem grande conversa e menos perguntas: ao reconhecimento da presença um do outro aproximamo-nos, sorridentes, e de uma troca de abraços apertados sai um encontro de lábios e braços à volta do pescoço ao som das nossas bandas favoritas. Ficamos ali em transe, com as mãos em busca do prazer fácil. Nada mais existe. Depois eventualmente iremos à procura dos respectivos grupos de amigos, com promessa de reencontro, mas perdemo-nos e acaba por ir cada um à sua vida, que esta tem dois dias. Em Paredes de Coura foram os de sexta e sábado.

Chegámos após cinco horas de viagem, com direito a paragem na Mealhada, que tem provavelmente a zona de restauração mais impessoal da história das zonas de restauração impessoais. Rolámos perto de 40 quilómetros com o carro na reserva até conseguirmos atestar, a seis quilómetros de Paredes, bem pertinho da fronteira com nuestros vecinos, já depois de um sul-americano com pinta de mouro festivaleiro ter forçado uma fila gigante à saída da A3 por ter o carro ali bloqueado. Aparentemente não conseguia pagar com o multibanco os - vi eu, que saí do meu carro para lhe perguntar “que pasa coño?” - mais de 30 euros que devia, provavelmente oriundo da lua.

Quando fui atestar reparei que o mesmo bicho sul-americano com pinta de mouro também estava ali naquela área de serviço, mas com outra missão: levar para o carro três ou quatro litros de coca-cola. Menino. E nessa altura eu nem fazia ideia de que no recinto iria encontrar um bar com bebidas brancas, algo que nunca vi nos outros festivais. Holy fuck, que bom.

amanhã faz sol, vais ver
Estacionei o carro na íngreme rampa que liga o recinto à rotunda principal, logo à entrada da localidade. Era uma zona que fazia comichão ao meu amigo P., sempre muito zeloso na relação causa-efeito do acto humano. Ao invés, o spot parecia muito bem ao casal de quarta idade que abordei na esperança de que me dissessem precisamente aquilo que viria a ouvir. O lugar era “óptimo”. Após o consentimento de quem mais sabe deixei-os retomar o caminho de mãos nas costas, na paz do senhor, e sentámo-nos na bagageira aberta a comer sandes mistas e a estrear a nossa belíssima garrafa de jameson que custou três contos ao P. Por essa altura percebia que estavam a terminar os Battles. Seguiam-se os Deerhunter. Deixámos a garrafa com menos de um terço por acabar e ala que se faz tarde. O Bradford Cox é uma figurinha. Enfiado à larga numa calça de bombazine verde-louro morto e num casaco laranja, com o cabelo à ace ventura em áfrica, o líder dos Deerhunter aproveitava cada intervalo entre canções para, de forma pausada, quase monossilábica, explicar até que ponto via Paredes de Coura como um local assombrado. E acrescentava: “I like it”. O momento alto foi a cavalgada épica no hino ‘Nothing Ever Happened’. Por alto contei uns 15 minutos de jam. Não é para todos.

Seguiram-se os Kings of Convenience no Éden, como apropriadamente os noruegueses apelidaram Coura durante e após o concerto no qual foram aclamados como nenhuma outra banda na edição'11, que tenha reparado. A razão é uma cena que neste caso lhes assiste.

a minha foto ficou mais gira que a tua
Tinhamos sido recebidos com um sorriso gigante pela Pª, de quem gosto muito. Esta era a minha primeira vez no festival de Paredes e ela, a quem não via há muito, queria saber o que eu achava – a Pª que ama aquilo tanto quanto se pode. Disse-lhe o óbvio.

A zona envolvente ao festival é linda de morrer e a verdade é que toda aquela beleza, sublimada no anfiteatro natural que recebe o palco principal, parece moldar o ambiente, retirando velocidade à malta em prol da contemplação. Talvez por isso se explique o sucesso retumbante dos baladeiros noruegueses, que chegaram mais cedo a Paredes e foram vistos e fotografados a passear pelo rio Coura num barquinho de borracha, cantarolando de viola na mão. Um dos momentos mais emocionantes foi sem dúvida o último tema do alinhamento dos Kings of Convenience, ‘Homesick’. Dedicaram-no a uma miúda – não foram os únicos... - que conheceram no rio. Só lhes fica bem. De pronto os isqueiros saltaram dos bolsos de quase 20 mil pessoas - tanto lume. Arrepiou. Não estava à espera daquilo.

Kings of Convenience: apoteose final
Em Paredes de Coura é tudo outra coisa. Se o festival fosse uma droga era sem dúvida erva. Gargalhadas, paz e amor. Algumas trincas a fundo, também, como bem senti na boca – uma vez é giro; sete ou oito vezes para te esburacarem o interior dos lábios tipo máquina de costura ra-ta-ta-ta é desnecessário e tem consequências, digo, sei eu - depois do concerto da matulona Marina Diamandis, líder dos Marina & the Diamonds, aquela galesa que está obcecada com a trapalhada que é a América, a partir de onde nos infectaram ao ponto de querermos beijar à chuva. Passou meio despercebida - a música da banda, não a Marina.

Por essa altura circulámos até ao palco secundário, que é logo ao pé do outro e provavelmente será a coisa mais sem graça que por ali vi. Depressa ficava à pinha e o facto de estarmos à espera de Metronomy só precipitou uma enchente excessiva. Quase não me lembro do concerto: passei esse tempo com a R., que fez questão de me levar pelo braço para junto do grupo de amigos dela, onde estava um rapaz que eu sempre julguei andar com ela, mas nunca o perguntei. Não tenho que perguntar. Mas achei de mau gosto e confesso que não me senti há vontade, pelo que puxei-a para outro lado da confusão assim que a apanhei distraída. Mas ela tem sardas e é bonita e gosta de Metronomy, pelo que a vontade própria tem limites.

As meninas do festival passavam o tempo a fazer bolas de sabão e eu, claro, fiquei sem dinheiro no telemóvel. Também me perdi da R., que me viu a falar com uma DJ de um bar em Lisboa e pareceu não ter gostado muito daquilo. Paciência. Eu cá já não via nada à frente.

Por volta das cinco da matina subimos a encosta para depois a descer pelo outro lado, rumo ao carro. Agendado estava um almoço em Chão, a seis ou sete quilómetros dali, na casa dos donos de uma cervejaria em Lisboa na qual janto há alguns anos. Esta era a terceira vez que os visitava em Agosto e a primeira do P., que é meu vizinho, homem de Direito e bom rapaz.

Esticámo-nos no carro e tentámos dormir, mas o calor da manhã chegou rapidamente e em força. Acabámos por adormecer com as portas abertas, à grande. Algures ali a meio da manhã saí para ir à bagageira buscar qualquer coisa e vi um carro cheio de espanholas feias enlouquecidas com uma média de 80 kg cada e uma condutora a tentar meter a primeira, sem o conseguir. Quase se espetaram contra uma casa onde se doa sangue à boleia de uma marcha-atrás involuntária. Quando acertaram com a mudança chegaram-se ao pé de mim e convidaram-nos para ir com elas. "Vão dormir aí? Temos uma casa em Espanha!"

Conselho ao P.: para a próxima tenta apanhar o rótulo do muralhas de monção que bebemos à uma da tarde junto de enchidos, pão, queijinho e um belo churrasco
Ainda perguntei ao P. se estava inclinado para aquilo mas levei logo um arranque e achei melhor dizer-lhes que não tinhamos grande interesse em cruzar a fronteira com elas devido a planos matutinos. Elas nem protestaram muito e salvo erro tentaram outro carro, uns 30 metros à frente. Sozinhas não devem ter dormido.

Dormi duas horas e ao acordar com o cabeção do século reparei que tinha duas chamadas não atendidas do senhor C., o dono da cervejaria. Liguei-lhe do telemóvel do P.: tinha passado por Coura de manhã e queria saber se estávamos numa de antecipar a almoçarada. Eu, que me encontrava perfeitamente desfigurado, a começar pelos lábios, disse para ele esperar um bocadinho.

“Vamos ao rio e já aparecemos!”. Mais tarde soubemos que eles passaram perto do nosso carro de portas abertas e monos lá dentro, e a dona S. percebeu que se tratava do meu. Estiveram para nos acordar. Deus é grande: não o fizeram.

o senhor C. é o melhor contador de anedotas de sempre - oh a cara dele aqui a desmanchar  o P., oh - e adora o meu chapéu de "vendedor de gado", he says. À atenção das meninas: é filho do senhor D., que fez este e mais nove filhos além de ter vivido 18 anos em França
Ao invés de chapinhar no rio Coura fomos para um café. Lavámos a cara e pusemos as ideias em ordem. Seguiu-se um almoço fabuloso em Chão, onde uma família de gente boa nos esperava de braços abertos. Tinhamos de fazer boa figura e não poderia haver lugar a esquisitices. Eu cá já me sentia fino e comecei a devorar enchidos e vinho como gente grande. Foi um fartote de comer, beber e rir. Temos ali amigos.

Para moer o almoço descemos a rua (a única de Chão, possivelmente) e fomos a um café atacar um digestivo. Lá dentro, como é óbvio, personagens de banda desenhada. À cabeça de todos o iluminado Zé da Tulha, irmão do Quim da Tulha e da Adélia do Cadete Caralho. Isto, claro, além de ser amigo da pinga como poucos. A dada altura o bicho de 50 e tal anos, baixo, franzino, seco, bigodaço, deitou-se mesmo à entrada do café a passar pelas brasas. Mas depressa acordaria, cortesia de uma senhora que lhe derramou cerveja na cara para gáudio de todos quantos ali estávamos. Ela ria-se muito e ele passou por ela a resmungar “filha da puta, filha da puta”. Eu já ia no segundo whisky e tinha as bochechas doridas de tanto rir.

Não ficámos lá muito tempo porque queríamos ir a banhos e curtir o famoso jazz na relva. Nas margens do rio, centenas e centenas de festivaleiros sentados na relva, a mergulhar ou a passear de barco naquelas águas gélidas. Um ambiente que tem de ser vivido para se perceber o porquê de tanto elogio. Há gente a ler, outros a torrar ao sol, a dormir, a namorar, a fumar, a beber, a roncar, a cantar, a fazer nada. Reina a paz. Também em paz estava o palco do jazz na relva, que aparentemente acabou quando chegámos – foi o que percebi ao dirigir-me feito tolo ao backstage a perguntar pelo concerto a quem arrumava o equipamento de som.

Ouvi esta resposta: “agora só para o ano.” Fuck.

Subimos a serra e atacámos o concerto dos peixe-avião já depois de eu ter passado pela zona VIP e, dizem-me, ensaiado um shake de kizomba. Sempre achei muito sem graça o som dos peixe-avião. Reforcei a ideia. Mas no horizonte estava já o concerto dos Linda Martini no palco principal, praticamente cheio logo às 18:30, só que o meu karma voltou a fazer das suas. Tirei a mochila dos ombros e percebi que o bolso mais pequeno estava entreaberto. E a minha carteira?

Muito serenamente, a explodir por dentro, disse ao P. que precisava de ir ao carro, agora estacionado longe para xuxu, e lá fui, já sem grande fé de evitar uma grande chatice. Mas claro que encontrei aquela merda no porta-luvas, ficando pelo carro a beber o resto do Jameson, imaginando de que forma ‘As putas dançam slows’ e a pensar, “Getting away with it all messed up, that’s the living”.

Two Door Cinema Club, No Age e Mogwai were next. Os primeiros deram uma grande festa, mas achei que as músicas eram um pouco enfadonhas, na medida em que estavam construídas praticamente da mesma forma. No Age, de quem o meu chefe cool é fã incondicional, fizeram um espectáculo a rasgar tudo. Uma energia inesgotável. Valia tudo. O punk ainda tem quem carregue a sua bandeira. Mogwai foi deslocado. No dia anterior teria feito mais sentido. Pareceram distantes. Pareceu que estavam a tocar ali há dez ou 12 anos e dali não sairam, só o público é que mudou. Por fim, para fechar o palco principal, DFA 1979. Não vou muito à bola com aquilo. É histerismo a mais.

Fui jantar, tarde mas fui, e encontrei amigas do P., ele que se refastelava num harém sem me dizer nada, o macaco. Ficámos com elas, bem simpáticas, e posteriormente fomos todos juntos gingar com Orelha Negra. Ao mesmo tempo, centenas de pessoas concentravam-se junto a um ecrã que passava a final do Mundial de sub-20. Levámos na boca mas só o vi já em casa do senhor C., onde tinhamos combinado ir dormir. Chegámos lá pelas 3.30, tendo sido recebidos pela dona S. e pela filha Cª. Tinham preparado um lanche para nós, adoráveis. Viram connosco como o Brasil virou de 1-2 para 3-2 contra o Portugal e fez a festa à nossa custa. Dormimos que nem anjos, claro.

No dia seguinte novo almoço e o reencontro com o Zé da Tulha, que estava mais calmo por ter rebentado o pára-lamas do seu renault clio branco speedline na noite anterior, pudera. Um amigo dele com olhos a fitar direcções opostas disse-me que o conhece há 28 anos e nunca o viu tão ceguinho como na véspera. E chegou o tempo das despedidas. Beijos, agradecimentos pela incrível hospitalidade e promessas de retorno. Era tempo de atacar a estrada. Estivemos a um detalhe de ir a Aveiro ver o Sporting, mas a fila, soubemos já perto da saída da A1 que nos interessava, dava a volta ao estádio a uma hora do início do jogo. Vimo-lo na estação de serviço do Pombal. Aquela gente viajada ainda ouviu um par de gritos meus, mas não parti nada. E com isto levámos tenda para Paredes de Coura sem sequer a termos montado. Pfff.

quarta-feira, 17 de agosto de 2011

Olhá bolinha!


Cumprido que está um prazo de dois dias ou coisa assim, o Castelo encerrou as inscrições para o grande concurso que conduz à conquista de uma bola de berlim, com creme, ainda por cima do dia. As legendas candidatas a descrever a fotografia do post anterior, confessamos, excederam as melhores expectativas – em quantidade, densidade e parvoíce. Por outras palavras, arranjaram-nos um belo sarilho: o que fazer se tanta gente merece receber o título de grão-mor do respeito escocês? A situação é bicuda, salvo seja, mas foi encontrada uma escapatória justa: haverá prémios para todos. Já a bola de berlim, como combinado, será mastigada pelo grande vencedor.

Resultados:

“?” (M.J.) - Prémio ‘o maior almoço de sempre'.

“Flutuadores” (Berbiganito) - Prémio 'javardeira 1.0'.

“E tudo a corrente levou” (Martini) - Prémio 'Jeff Buckley’.

“Paz antes do suicídio” (Pink Poison) - Prémio '(indicador na boca) shhhtt…'.

“Peace of mind” (Cat) - Prémio 'It’s oh so quiet… it’s oh so still'.

“Here comes the sun, little darling!” (Di) - Prémio 'George Harrison meets Sasha Grey'.

“Under the thoughts”; “Diving in peace”; “Frio na barriga” (Ana Roman) - Prémio 'Sancho Pança'.

"Ao largo, pusemo-nos a boiar de costas e, na minha cara voltada para o céu, o sol afastava os últimos véus de água que me escorriam para a boca". (Ana) - Prémio 'Ler é sexy'.

“Com duas bóias dificilmente vou ao fundo” (Chirola) - 'Prémio javardeira 2.0'.

“After the storm” (Soninha) – Prémio 'Revelação'.

e… 'Prémio bola de berlim':

"I can still hear you when you drown" (Tiago)

Clap Clap Clap ao Tiago, obrigado a todos pela participação e cuidado com o sol ali entre o meio dia e as quatro (L)

segunda-feira, 15 de agosto de 2011

"Welcome Home", por Benoit Paille


Quem oferecer a melhor legenda a esta fotografia (cliquem nela para ver tudinho como deve ser) ganha uma bola de berlim. Temos com creme (fuck ASAE). Furto efectuado a um canadiano, este, que de si próprio diz isto: "I am a self-proclaimed genius."

Regulamento do concurso:

* convém que haja pelo menos dois concorrentes, mas se só houver um também entregamos o prémio.
** o prazo de inscrição acaba depois de amanhã ou coisa assim.

quinta-feira, 11 de agosto de 2011

Andas com apetites? Aiuê, lê isto pá!


Era uma vez o meu estômago dorido depois de um dia de trabalho, a caminho do Amore Mio, um restaurante italiano que fica ali entre a Praça do Chile e a Alameda. A meio caminho, no largo do mercado de Arroios, reparei numa casa castiça, que de fora tinha mais jeito de café do que propriamente de restaurante. Espreitei e gostei do que me pareceu ver. Tudo bonitinho, muito clean, mas com uns quadros fogosos na parede. Iko’s. “Deve ser grego”, pensei, projectando logo a hipótese de um dia ali jantar.

Ontem foi o dia. Combinei com um amigo e mal entrámos no restaurante apercebi-me de que estávamos muito mais perto de Luanda ou Maputo do que de Atenas. O espaço é pequeno (24 lugares sentados) e acolhedor, com decoração a evocar as raízes dos donos, que, soubemos depois, são moçambicanos. Fiquei logo maravilhado com os lindíssimos e coloridos batiques espalhados pelas paredes, a lembrar-nos que África é cor, exagero, mãe.

Enviei logo mensagem à minha: “Maluquinha vou comer moamba! Já te digo se valeu a pena.”

Como me aguentava em pé à boleia de benurons, depois de uma daquelas noites boas de suores frios e facadinhas na garganta, ainda pensei em seguir o mau exemplo do meu amigo, que geralmente bebe água à refeição, coma o que comer. Depois reflecti melhor e com receio de ir parar ao inferno pedi meia garrafa do tinto da casa, cujo nome escandalosamente não recordo - era bom, ué!


Da ementa integralmente africana, onde constavam sobretudo pratos de Moçambique, mas também angolanos e de São Tomé, pedi então moamba de galinha e acompanhei-a com farinha de mandioca, feijão com óleo de palma, arroz de côco e uma salada de tomate picante cujo nome tinha umas 20 letras e era qualquer coisa como sarabalalulusalalala.


Naquele momento vi os meus pais a dançar descalços num baile do Lobito, entre amigos, numa roda, com aqueles mano a mano em que homem e mulher descem lentamente até o rabo encostar nos calcanhares enquanto se desafiam ao modo de “anda cá, mostra o que vales”. (Não vale cair).

No Iko’s, cujo nome deriva daquele pelo qual responde o dono, Frederico, tudo é pensado para satisfazer o cliente. Ao contrário do que se possa esperar, o prato que nos chega à frente não vem a arfar de piri-piri. Queres picante? Pedes e pões. Foi o que fiz, sempre na esperança de um dia me habituar àquilo, à imagem do que acontece com toda a minha família, mas não há remédio. Mal despejei umas gotas de gindungo na minha moamba e levei uma perna à boca... torneira aberta. Ao meu lado o meu amigo ria muito à minha pala, porque no caril de caranguejo dele não se passava nada, mas quando lhe dei a provar um canto do meu prato especialmente atestado ele ficou vermelhão e a passar guardanapos na testa e não parou de se queixar até ao fim do jantar. A vingança serviu-se quente, muahahaha.

Se ainda não falei do atendimento é por mera distracção. É afável, atencioso, sábio. A moçambicana que nos atendeu tinha o maior sorriso do mundo e sabia dizer o nome da salada sem se atropelar a meio caminho. Pedi-lhe duas vezes para dizer o nome e não errou. Há gente com muito talento.

Antes do jantar tínhamos pedido de entrada um prato com queijo de ovelha derretido, que a mim pareceu qualquer coisa como um divinal pão com alho e queijo, mas sem massa. O pão que acompanhava o queijo podia ser mais saboroso – do dia, claro, mas integral, ou perto disso.

Com aquilo tudo fiquei de três meses e o meu amigo, que naturalmente já os tem, cresceu para seis. Mas porque a nada se poupa, ele ainda pediu uma mousse de caju que lhe soube a iogurte – “não encontro o sabor do caju”. Eu, que geralmente prefiro sobremesa líquida (água da escócia) à sólida, pedi apenas um chá de menta e fiquei ali cinco minutos a inalar os vapores para matar ácaros. Pagámos menos de 20 euros cada. E durante aquele tempo todo o plasma da casa dividiu-se entre um canal de música (MCM), um DVD com uma reportagem sobre a cultura de Maputo e o cabazo de Portugal ao Luxemburgo. Gostei muito. Até o lavatório da casa de banho é giro. A cozinha está aberta até às 23:00 durante a semana e à sexta e sábado ainda dão mais uma abébia extra. Mas não apareçam ao domingo. Esta gente merece descanso.

Site: aqui.

quarta-feira, 10 de agosto de 2011

Ouvi dizer


Serviço individualizado

Funcionária de loja de centro comercial: Olá, boa tarde, posso ajudá-lo?

R: Podes. Quero uma t-shirt amarela, mas simples, sem merdas.

FDLDCC: Ah, claro. Siga-me.

(sigo-a)

FDLDCC: Temos esta, gosta?

R: Gosto, mas fica-me larga de certeza. Não tens uma versão mais encolhida?

FDLDCC: Não, só um número acima ou dois abaixo.

R: É um bocado larga. Mas vou experimentar.

FDLDCC: Isso, faça isso. Mas experimente aqui, temos um espelho. Se você fosse mulher iria para o provador... mas como não é... experimente aí.

R: Claro, homem que se preze mostra a barriga de cerveja ao povo.

(risinhos)

(experimento)

R: Está larga.

FDLDCC: Oh que pena...

R: Era mesmo isto que andava à procura, tss tss.. Não faz mal, obrigado pela atenção.

FDLDCC: Oh lamento muito. Gostava imenso de poder satisfazê-lo.

Gaitán

O Benfica está a jogar contra o Arsenal e o comentador fala no Gaitán. A minha avó fica agitada e prepara-se para discursar.

V: Quem sabe se esse Caetano não possa ser o filho do filho da minha tia que vivia nas costas de Algés quando eu estava em Lisboa à espera de poder ir para Angola. Se o filho se chamava Caetano o filho do filho também pode ser Caetano.

(Eu e o meu pai piscamos o olho um ao outro e vá de botar lenha)

R: O Gaitano, Vivi?

V: Sim, quem sabe não possa ser ele. Nunca tive conhecimento de haver outro Caetano no mundo.

R: Mas este é argentino Vivi.

V: E então? Pode ser e pode não ser.

(corro a abraçar a Vivi).


Why I Love Soph .

r.: bom dia!

s. ruisinhoooo

bom dia

a bolsa aqui tá tudo louco

e desesperado, a perder dinheiro

r: sério?

tudo ao telefone e aos gritos?

s: e depois perguntam-me se eu tou bem...e eu claro...não tenho dinheiro..não perco nada

r: lol

s: sim

e televisões em todo o lado

cheio de gente histérica

e eu bué tranquila

imagina

lol

r: mas tu trabalhas numa bolsa?

s: eu trabalho na bolsa de valores

darling

faço reportagens em brasileiro e espanhol remember?

r: eu esqueço me sorry

falas bem espanhol?

tipo mt rapido tralarararararaara mm rápido?

s: não muito rápido

tenho de sorrir também.

quinta-feira, 4 de agosto de 2011

Bruges


Gostava de poder dizer que fui eu a tirar esta foto mas obviamente que isso não aconteceu e aliás não encontro as minhas

A minha vontade era hoje estar em Bruges. É uma cidade com uma beleza antiga, mas sem estar coçada ou cheirar a mofo. Para um sulista simplório como eu, habituado a conviver nas ruas com a mais versátil porcaria e discussões espectaculares que terminam com raptos, tiros ou beijos, pode irritar de tão limpa, serena e organizada que é. Como tem pouca agitação nocturna, como o povo é contido, como não há exagero que envolva pulsação, pode ser vista como um postal, beleza morta. Pode. Não é o meu caso: férias são férias. 

Aqueles que moram no encanto que é Bruges, considerada a Veneza do Norte por ser penetrada por muitos canais, gostam que a cidade seja aquilo que parece: um delicioso monumento flamengo, um gigante bairro medieval pontuado por arquitectura gótica, uma homenagem ao bom gosto, uma puta fina para a qual olhas sem poder tocar, e aprendi isso mesmo num passeio de bicicleta à chuva.

Por lá ficámos acomodados duas ou três noites num hostel encavalitado num dos bares mais movimentados da cidade. E com duas barmaid que até perturbariam as hormonas (?) do Papa. Na primeira manhã saímos do hostel, à chuva, procurámos uma casa de binas, à chuva, alugámo-las enquanto chovia e à chuva pedalámos o dia todo, frequentemente atrás de  um cavalo [ver foto ao canto superior direito do blogue] que puxava um coche turístico e borrifava a atmosfera com um colossal cheiro a mmmerda.

A dada altura já tínhamos pedalado tanto numa determinada direcção que achámos por bem inverter o sentido. Estávamos num parque bonito. Tínhamos chegado até ali respeitando uma das várias ciclovias que cortam a cidade, e, no ponto em que decidimos o retorno, começava ali ao lado (ou acabava, consoante a perspectiva) uma outra via – esta para peões, ou pessoas. Claro que dei a volta por ali, desviando-me a abrir entre a malta, pessoas como pinos. O que não esperava era que, acto contínuo, um revoltadíssimo pai de família de 3,40 metros de altura saísse disparado na minha direcção com vontade de me distinguir com valentes pontapés honorários no cu pelo mérito de não respeitar a mão do trânsito sem motor. Apesar de ir montado nele próprio, o bicho ganhava terreno de forma preocupante enquanto vociferava em neerlandês coisas que adivinhei serem contra a minha mãe, e portanto injustas, que ela não tem culpa dos meus disparates. Lá me consegui afastar, contra-argumentando, “moooce, tás maluco dé!”. Daí que gostava de deixar aqui um conselho, já tardio para a Di: se forem a Bruges, evitem a contramão; a bem do vosso respeitável traseiro.

terça-feira, 2 de agosto de 2011

Enjoy the Silence

Não me lembro bem quando comecei a ouvir aquilo que interessava, talvez uns oito anos, mas sei onde. Foi na casa dos meus pais, na garagem do país. Eles dormiam no andar de cima, enrolados à esquerda, havia o quarto do meio, onde dormiam as visitas e hoje durmo eu, quando lá vou, every now and then, e por fim o quarto do lado direito, onde dormia com o meu irmão. Entre as nossas camas de corpo e meio com colcha de fundo branco e desenhos às bolinhas coloridas repousava na mesa de cabeceira, frequentemente por mim cabeceada, um pequeno rádio leitor de cassetes. Entre outras qualidades que o meu irmão tinha, faço bold a esta: ouvia e continua a ouvir boa música. Nunca foi “indie”, aquilo que chamam a quem vai atrás da coisa nova, mas dentro do que a público acontecia, do que passava na rádio, as escolhas dele pareciam-me ter emoção de ser.

Faziamos programas de rádio. Ele, quase oito anos mais velho e o motivo pelo qual estou a escrever isto, na medida em que a dada altura, bloody bored, pediu “um mano para brincar”, era o locutor/DJ; eu, o ouvinte e comentador que nem idade tinha para saber o que era uma mulher. Inseríamos as devidas cassetes dentro do devido leitor sempre à devida hora, quando o meu pai já roncava e a minha mãe acordava-o só para ter a hipótese de adormecer primeiro – ele nunca a acordaria, está quieto -, embora raramente conseguisse. No limite o truque dela era não lavar os pés antes de se deitar, virando a almofada para o fundo da cama e coiso. “Agora vá, ressona que eu quero ouvir”.

Amo os meus pais.

Nos nossos programas de rádio clandestinos, sempre sussurrados madrugada dentro, os protagonistas deviam ser muitos, mas só me lembro dos R.E.M., The Cure e, last but not least, Depeche Mode, sobretudo com a Enjoy the Silence - cujo teledisco, vim a saber anos mais tarde, foi parcialmente rodado na Praia da Rocha, onde pontifica o 'tudo ou nada' desde que me conheço (?).

Miguel, talvez 16 anos: “Caros ouvintes, convosco, Enjoy the Silence”.


Miguel, talvez 16 anos: “Caro Rui, o que tem a dizer sobre a música?”

Rui, talvez oito anos e voz de gás hélio: “É fixe!”