Entrámos no Buddha Bar de Milfontes durante a pausa do músico
que lá ia tocar pela primeira vez, no sábado à noite. Queríamos, e até poderíamos
ter chegado a tempo - era o combinado -, mas tivemos de nos demorar na Tasca do
Celso porque a mulher do dono nos ofereceu licor de bolota e um cestinho com
nozes, amêndoas e figos. O Duarte Gomes também lá estava a jantar. Encheu a
boca de sei lá o quê e bebeu cola zero, na companhia de uma garota com dentes
de vinho, e em menos de nada se pôs a andar. Gosto de pensar que se desfez em -
pronto, nisso mesmo. Ela que seja feliz.
O músico do Buddha Bar de Milfontes trazia uma camisa pálida
enfiada numas calças de ganga muito grandes e via por óculos; tinha uma voz
grave e desolada; era pequeno como um pinipom.
Recomeçou nas cantigas com a ‘I’m on fire’ do Bruce
Springsteen e daí passou para a ‘This is the Life’, da Amy Macdonald. Ocorreu-me
pensar nele como o Cantinflas do rock ligeiro. Numa das mesas, tal como na
véspera, estava um rapaz que não deve fazer a barba há 15 anos e a namorada,
que lembrava a Juliette Binoche e dizia nunca ter acordado ressacada na vida,
apesar de lhe dar bem na cerveja. Jogavam ao dominó.
O rapaz da barba até ao umbigo passou a segunda parte do
concerto do Cantinflas do rock ligeiro a pedir ‘Ring of Fire’ do Johny Cash,
mas não teve sorte porque o músico não tinha nada disso no repertório dele. Não
satisfeito, esperou que o Cantinflas abandonasse a guitarra e, quando isso
aconteceu, precipitou-se para o palco e atirou-se à ‘Ring of Fire’ alegando estar
farto de ver a namorada dar-lhe na tromba no dominó.
Tocava e cantava “(…) The taste of love is sweet (...)’ como
se fizesse vida daquilo, e pelos vistos faz. É guitarrista numa banda de
destruição maciça chamada 10 000 Russos.
Ainda tocou mais alguns temas e depois regressou à mesa para
dissertar sobre a influência do Bob Marley na história da música, que dizia ser
coisa nenhuma. “O Lee Perry, os gajos que inventaram o dub, isso sim; o Bob
Marley não fez nada que já não tivesse sido feito”, argumentava. Quanto à Rosa,
dona do bar que por essa altura já se tinha juntado à confusão, contrapunha que
o Bob Marley era muito bom porque ela gostava muito dele.
Começámos a falar de cumbia e em poucos segundos já tínhamos
assaltado a aparelhagem com Chicha Libre. Dançámos como macaquinhos, bebemos e
os clientes fugiram. “Voltem!”, pediu a Rosa na despedida.
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