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Longe vai o tempo do bigode. Aqueles que outrora acompanhavam os exóticos projectos musicais de João Paulo Simões – Belle Chase Hotel e Quinteto Tati à cabeça -, em busca da grande farsa, podem abordar o concerto de amanhã na Zé dos Bois (ZDB), às 23h, por um de dois métodos: ignoram-no, ou juntam-se à manada e preparam-se para experimentar uma outra coisa: JP Simões, a solo, mais cáustico no seu eterno equilibrismo pelas traves da lusofonia e, decididamente, numa outra ve-lo-ci-da-de.
Antes perseguia-se um moderníssimo fantoche de cabaré - baton e bigode, traje feminino na madrugada do Técnico -, hoje contemplam-se as diabrices linguísticas do homem que refinou por detrás desse mesmo fantoche, filho bastardo de uma geração hedonista que tropeçou em si mesma, e a cantar caíu. Não que fosse uma urgência - "Exílio", dos Quintento Tati (2004), é delicioso -, mas a mensagem do músico conimbricense aprumou-se: aos 38 anos, escreve com autoridade sobre uma colheita da qual ele próprio brotou, uma Coimbra a olhar para os lados, esvaziada de sentido, arrastando-se pelo experimentalismo dos anos 80.
“A minha geração já se calou”, avisa JP Simões, na canção que dá título ao seu disco de estreia a solo, “1970”, ano em que o próprio nasceu e sabrina sobre a qual o concerto de amanhã rodopiará; espartilhado entre a geração “dos grandes paizinhos do céu”, e o borbulhar do egocentrismo convicto, JP é metade de tudo, metade de nada.
Noutros tempos, entraríamos na ZDB à procura de uma evocação colectiva do esdrúxulo, que é simultaneamente detalhe e, enfim, o essencial. Mas como já não há bigode, e muito menos traje de cabaré para perseguir, o melhor é mesmo pedir o nosso copo e aproveitarmos a boleia do novo JP: alguém com a perfeita dicção, que canta "os mesmos dilemas, mais velhos", e estatelou-se “docemente contra o céu”.
3 comentários:
eu não conheço e isso preocupou-me, perante o texto...
Hoje vamos ver o Grande Prémio Simões! Inquietação, inquetação...
Estou a ver que continuas a conhecer mais música da boa. Este concerto da ZDB passou-me ao lado, mas tive o prazer de estar no concerto de lançamento do "1970", já há quase dois anos no Santiago Alquimista, numa noite que me trás boas recordações.
Quanto ao Quinteto Tati, tenho só a dizer que "Exílio", é um dos melhores álbuns portugueses dos últimos 30 anos.
Para quem gosta do senhor Simões, fica a sugestão: José Mário Branco, o melhor compositor português a seguir a Zeca Afonso e Sérgio Godinho. "Cá dentro inquietação"
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