"The only people for me are the mad ones, the ones who are mad to live, mad to talk, mad to be saved, desirous of everything at the same time, the ones who never yawn or say a commonplace thing but burn, burn, burn like fabulous yellow roman candles exploding like spiders across the stars." J. Kerouac
sexta-feira, 30 de novembro de 2012
sexta-feira, 23 de novembro de 2012
M
Disse-lhe ao telefone que o plano era invadir uma festa de inauguração de casa para a qual não tínhamos sido convidados. Primeiro hesitou; depois pediu-me quinze minutos. Teve vinte. Apanhámo-la à porta de casa, já depois de termos ido a uma mercearia de indianos comprar litrosas e um queijo duro, o nosso contributo. Em vinte minutos percebemos que se pôs mais bonita do que muitas mulheres conseguirão em toda a vida.
quarta-feira, 21 de novembro de 2012
Parabéns à Mãe Coelho!
Dá-se o caso de que a mais bela das mulheres que Angola viu nascer tornou-se mais tarde minha mãe. Não tem lá muito juízo, a Fatinha, mas, aqui entre nós, bem sabemos como isso é pouco importante quando se tem um coração gigante como o dela. A Mãe Coelho é uma Força da Natureza. Fosse eu personagem de banda desenhada e seria o Gastão - é muita sorte junta.
sábado, 17 de novembro de 2012
Lisboa, oito da manhã
Ao grito de comando (portas do comboio a abrirem), do outro lado da linha, uma massa humana avançava, muda, para a rua. Ouvia-se o som incoerente de passos arrastados, trabalhadores com o desconsolo de um exército em retirada. Era vê-los, curvados, acompanhando o movimento dos próprios pés, talvez não quisessem fitar o horizonte, onde o futuro fica mais nítido - a recompensa pelo trabalho tornou-se incerta e frequentemente insuficiente. Depois deles, outros. Mudos. Muitos. De onde os via pareciam-me os mesmos, mas não tinha como provar a coincidência. Cheguei a casa a compreender que nunca tinha visto junta tanta gente desencantada.
sexta-feira, 16 de novembro de 2012
Cinema (também) é música
Muito do que gostamos num filme se deve ao poder das músicas que aqui e ali caem quando devem cair, como frutos maduros, é o imenso poder da relação som-imagem a revelar-se, poder esse apenas superado pelo admirável mundo da nossa imaginação. Um violino, uma guitarra na cena certa - eis potencialmente especial um filme vulgar. (Ainda não consegui perceber se o contrário também é lei).
Claro que há excepções, Sherlock: os filmes sem música. Mas a primeira recordação que guardo de muitos dos filmes que tiveram em mim um impacto avassalador é a da respectiva banda sonora, quase sempre apta a deixar um algarvio como eu num estado emocional constrangedor.
O piano do "Piano", facilmente um dos meus filmes top-10, não tem comparação. Venha quem vier. É lancinante cada tecla batida pelo Michael Nyman, tudo a obedecer a um título perfeito - 'The heart asks pleasure first'. SIM.
A beleza melancólica do cinema do Wong kar-wai atinge o seu máximo esplendor neste 'In The Mood for Love', especialmente nesta cena, com este violino a pingar de cio.
O tema de Lara, que passa 578.938 vezes no maravilhoso Doutor Jivago.
Closer, cena de entrada irresistível num filme com alguns dos melhores-piores diálogos na história das relações ficcionadas, um pedaço de mau caminho no qual, por má sorte, viciei-me, que faz mal à saúde, que não aconselho a ninguém - somos assim tão maus uns com os outros?
Não aceito, não papo grupos sobre o Gran Torino - a grandeza do filme tem tudo a ver com a música-título ao piano do Jamie Cullum. Vá, e com aquele final aterrador.
Último, mas não menos importante, uma proposta que vocês não podem recusar.
quarta-feira, 14 de novembro de 2012
A Vingança
Juntas desde a infância
Brincavam com constância,
Viviam na mesma rua;
Eram mais os pedantes,
Atrevidos, bem falantes,
Que à morena queriam nua;
Dizia a loira que a amava,
Mas no fundo invejava
Tanto ver ela sorrir;
Dela queria a alegria,
as formas, a sabedoria
E seu homem p'ra despir;
Certo dia tal dilema,
Transformou-se em problema:
A loira p'la madrugada...
Seduziu-lhe o parceiro,
Com preceito feiticeiro
E beijou-o, descarada.
Estranhamente, a morena,
Feita estrela de cinema,
Conservou a confiança;
Deixou arrastar o tempo,
Renovou o seu alento
E preparou a vingança;
Tal e qual ela queria,
Ao raiar de um novo dia,
Num bar tudo aconteceu;
Afastou o parceiro,
Percorreu o bar inteiro,
Lambuzou quem entendeu.
E falando da amiga:
Morena, fera ferida,
Soube bem o que fazer;
P'ra casa levou atado,
Da loira, o ex-namorado,
E ganiram de prazer.
terça-feira, 13 de novembro de 2012
O patrão é amigo
Saio do trabalho e passo pela cervejaria da ordem antes de ir jantar a casa. Outros tempos - ao patrão faz-lhe quase tanta falta um bom caixa como a companhia após um longo dia de trabalho, mas é amigo e percebe o porquê de me ver cada vez menos, eu e outros. Sento-me ao balcão e peço uma cerveja. A casa está composta, observo, óptimo. Abro o jornal e troco ideias com a filha do patrão ao mesmo tempo que um cliente da casa que tem sempre mais vontade de falar do que coisas para dizer aborda os problemas do país. Oiço-o elogiar um antigo primeiro-ministro de Portugal (Santana Lopes), maldizer aqueles que não gostam da atual (Angela Merkel) e, já abandonado pelo casal que com ele jantara, declarar que a culpa disto tudo é do 25 de Abril. "Não devíamos ter entregue as colónias. Agora anda por aí a filha do Eduardo dos Santos a construir coisas, não é? Se fosse eu metia os pretos todos num monte e regav..."
Interrompo-o: "Homem, você só diz disparates."
O cliente da casa abre os olhos, chocado. "Calado, eu? Estou a dizer alguma mentira? Que disse eu de mal?", questiona-me, inquieto. Fito-o um par de segundos: percebo a inutilidade de lhe responder. Reabro o jornal. Ignoro-o. O cliente da casa amua e vira-me as costas. Finge dar atenção ao futebol na televisão. Há pessoas a sair da cervejaria. O patrão faz de patrão e entra na conversa. "Sabem uma coisa boa que o anterior governo fez? Desceu o 115 para 112." O ambiente está mais sereno, menos pela piada do que pelo saída de pessoas. O cliente da casa vira-se para mim feito cão sem dono e insiste: "Diga lá, sr. Rui, que disse eu de errado?"
Continuo a ignorá-lo, mas o homem não desarma, parece ter perdido a memória. "Diga lá que agora quero saber!"
Dou-lhe uma segunda hipótese. "Que há de ser? Aquilo de juntar pessoas e regá-las, acha que isso é coisa que se diga?"
Responde-me: "Ah, isso?! Mas é alguma mentira? Por mim era tudo junto, guineenses, cabo-verdianos e..." - e nada, que não lhe deixei acabar. Disse-lhe: "Oiça, não temos nada a falar, não quero saber do que você tem para dizer." Paguei a cerveja, "boa noite" para quem quisesse ouvir e saí atrás do último grupo de pessoas que deixava a cervejaria.
O cliente da casa ficou sozinho.
Lamento pelo patrão, mas ele percebe. É amigo.
domingo, 11 de novembro de 2012
Nunca tivemos Paris
Penso nas tuas pernas todos os dias. Há pouco vi-as na empregada de limpeza lá de casa e só não lhe pedi que ficasse para jantar porque nunca tiveste bigode. Lembras-te daquele corredor escuro? Nunca fomos tanto como naquela fuga de mãos dadas e em bicos de pés até à casa de banho, nus, com vontamedo de sermos vistos. Ter-te-ia falado no recorde do mundo da visita ao Louvre se soubesses quem é o Godard, claro, montada nessas coxas de cinema serias menina para o bater. Era da maneira que teríamos Paris.
quarta-feira, 7 de novembro de 2012
Obama
Muita coisa mudou em quatro anos. Nas fotografias e nos discursos, o Obama continua a ser o presidente que a maioria das pessoas que conheço gostaria de ter, mas perdeu a aura messiânica, foi despromovido à condição de comum mortal. É uma vitória diferente, esta, se comparada com a maravilhosa histeria colectiva que nos contagiou em 2008, que nos fez pensar no Obama como alguém que iria salvar o mundo. Tenho quase a certeza que ele julgava ter nas mãos o poder de fazer o que pensa - e acredito que pensa da forma certa. Mas não é assim que a política funciona, sobretudo nos Estados Unidos. Terá nascido no país errado. Seja como for, não tenhamos dúvidas: um democrata afro-americano que no seu primeiro mandato não invade países para "instaurar democracias" e consegue ser reeleito presidente dos Estados Unidos é coisa do além. Vou adormecer a pensar que nos próximos quatro anos estaremos num mundo menos bélico, menos mau. Vivo melhor com isso.
terça-feira, 6 de novembro de 2012
Vamos só ali casar e já se come o leitão
"... na saúde, na doença e nos petiscos" |
Troco, sem pestanejar, uma noitada com a malta por um almoço de família em Quatrim do Norte, depois de Olhão - desde que ficou tácito ser eu o condutor. Vasculhando lá atrás, não consigo encontrar o momento em que virou lei ser eu o condutor dos Coelhos. Não sei se a coisa partiu de mim - talvez me estivesse, algures, a meter em bicos de pés - ou se se tratou de um golpe de psicologia invertida aplicado pelos meus pais, a bem de hábitos mais serenos. Certo é que a coisa pegou. Sinto-me como o Alex da Laranja Mecânica caso o tratamento Ludovico o tivesse iluminado, oh my droogs.
Havia a promessa de um leitão na casa dos meus tios, em Quatrim do Norte, depois de Olhão, e deixámos Portimão bem cedo, antes das 11:30, desfalcados do meu irmão - motivos de gestão. Até há um ano a viagem fazia-se em três quartos de hora pela auto-estrada, mas desde então que, por motivos anti-roubo e alguma adrenalina, o trajecto se faz pela rua EN125. Muita chuva, 17 mil 890 povoações e quase hora e meia depois lá chegámos a casa dos meus tios, o nosso destino - ou assim pensávamos: todo janota, camisa para dentro das calças escuras, sapatos, seco como poucas vezes, o meu tio ordenou-me que não estacionasse ali em casa, de onde saía muita gente, mas desse meia volta e seguisse-o. O destino seria outro. Logo apareceu a minha tia, sorrisão, casaco preto e camisa branca. Os dois putos deles, meus primos, traziam roupa de quem vai para a escola.
Fiquei confuso mas projectei uma cerimónia de tomada de posse do meu tio como presidente da Junta de Moncarapacho, ele que é vice e um dia substituirá o presidente septuagenário que dança com todas as meninas da região. Sei lá, mesas com fritos e um discurso do meu tio, redondo e a terminar com o indicador e o médio em V.
Mas quem arriscou um entendimento bem audível sobre o imediato foi a minha mãe, que à falta de melhor informação descobre tudo por tentativa-erro. Pior que estragada desde que o irmão lhe pediu para aparecer às 12:45, sem falta, pois haveria lugar a uma "surpresa", ela fez o que sempre faz e chegou à verdade logo ali depois de dias a equacionar hipóteses. Sim, os meus tios iam casar-se pela igreja, 23 anos depois de o terem feito pelo civil.
A minha avó Vivi ficou satisfeita com a novidade, mas o que a deixou mesmo em estado de graça foi ter visto a caravana subir a rampa que dá acesso à igreja de São Sebastião dos Matinhos, onde fez a primeira comunhão há mais tempo do que lhe é possível lembrar. Pelas contas dela, ia para 60 anos desde a última vez que ali tinha estado - estatística não confirmada pela minha mãe, que a viu naquela igreja em tempos bem mais recentes, garantiu-me. Em todo o caso a Vivi é mulher de acreditar no que sente e mal entrou na igreja dirigiu-se ao altar para tomar conta daquilo tudo, agarrando-se aos beijos às santinhas, que receberam um banho de saudade. Já pronto para casar os meus tios com o preceito superior, o padre esperava, pacientemente, que a minha avó lhe desse o lugar.
Subi ao altar e trouxe-a pela mão.
O casamento foi espectacular. Apresentei-me de calças de ganga, botas, t-shirt dos The Who e barba de festival e em coisa de meia hora já o prior nos mandava de volta a casa do meu tio, onde devorámos a roupinha do porco novo sem piedade. Como manda a tradição, acompanhou-se o leitão com vinho tinto espumante, fresco - a digestão agradece. A Vivi só se sentou depois de andar de canadianas a percorrer os cantos da casa na qual se tornou gente. Uma alegria infinitamente triste tomou conta dela. "Ninguém imagina o que eu trabalhei aqui!", disse, como costuma dizer, mas também ninguém conseguiria adivinhar o quanto ela comeu e bebeu à mesa. O petisco foi uma festa - tanta confusão devia fazer eco do outro lado da fronteira. Brindámos ao segundo casamento dos meus tios e à saúde de todos. O meu pai ficava com o nariz mais vermelho a cada minuto. A minha mãe embebedou-se com metade de meio copo de vinho. Apareceram amigas da minha tia, entusiastas do Tony Carreira. O estardalhaço terá atingido níveis sísmicos. Os putos dos meus tios, um deles já na Universidade, riam-se dos estranhos comportamentos dos adultos depois de terem eles sido gozados quando leram passagens da bíblia com jeitinho de camionistas. O pai da minha tia falou-me nos méritos de um senhor que vende medronho do bom a um preço do melhor e a mãe dela aturava a minha avó a custo - sentada ao lado dela, a Vivi fazia tudo menos calar-se. "Vocês estão a gozar comigo porque eu tenho o-i-t-e-n-t-a e c-i-n-c-o a-n-o-s, mas tomara que cheguem à minha idade!"
O leitão, acompanhado de broa e salada, estava uma delícia. Depois houve bolos de chocolate, medronho, vinho do porto e café.
No regresso, já noite precoce, a Vivi perguntou-me: "Portei-me bem, filho?" Respondi: "Foste a melhor, Vivi!"
sexta-feira, 2 de novembro de 2012
Daqui a pouco...
A estrada e eu, de novo, sós, e papar quilómetros para me misturar com o que sou, ou fui, gente que se dá, exagerada, de coração rápido. Estar onde devo.
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