A Árvore da Vida é um filme-montanha. Longo, imenso, disperso. Não é fácil recebê-lo, percebendo-o – não, pelo menos, à luz da maior parte das coisas que já vimos no cinema. Não é para todos. Tem o Brad Pitt, que é um actor formidável, tem uma tal de Jessica Chastain, (convincente) mãe perfeita, tem uns putos e o Sean Penn. Não percebo que raio está o Sean Penn ali a fazer, e decerto ele próprio terá batido mal da tola a tentar compreender o motivo pelo qual entrava no filme até ter visto o puzzle do Malick já montado. “Sean, anda aí feito maluco a olhar para o céu”. “Sean, faz um ar confuso”. “Sean, caminha sem direcção”. (É preciso confiar nos loucos. Well done, Sean). A Árvore da Vida é um filme complicado. Há dinossauros e Brahms. É uma tempestade sensorial. É o sonho americano e dos outros, de nós. É o elogio de todas as coisas. É origem e fim numa marcação cerrada a Deus, confrontado e questionado do primeiro ao último fotograma. Nos créditos finais senti necessidade de gostar do que tinha visto, por muitas vezes que tivesse espreitado o relógio durante aquelas duas horas e meia - é uma sensação que vem crescendo, esta necessidade. A Árvore da Vida pisa o risco. Ultrapassa-o. É de um realizador genuinamente autor, um que não tem receio de ser diferente, porque enorme. É um filme que a espaços ultrapassa a nossa paciência mas deixa margem para o regresso ao bom gosto. E o remate da "história" é de muito bom gosto. E o que é o bom gosto? Coisa que se sente, não se explica.
"The only people for me are the mad ones, the ones who are mad to live, mad to talk, mad to be saved, desirous of everything at the same time, the ones who never yawn or say a commonplace thing but burn, burn, burn like fabulous yellow roman candles exploding like spiders across the stars." J. Kerouac
terça-feira, 31 de maio de 2011
segunda-feira, 30 de maio de 2011
Um dia destes ponho os patins ao facebook
Ao ritmo de dez posts por dia, B.D entristeceu às três de uma manhã. B.D “em baixo”, lia-se. Ao que parece alimentava - e queria que nós, amigos virtuais, o soubessemos - a vontade de desaparecer completamente à boleia dos Radiohead. Esse foi o último post do dia – já o penúltimo, a fonte da posterior solidão, dizia, “Bem... Eu já cá venho.” Pouco faltava para as duas da manhã. É possível que B.D tenha papado episódios daquelas séries que toda a gente saca e chega a ver temporadas inteiras num dia, que entusiasmo do caralho. Depois apercebeu-se de que era tempo de voltar a sentir-se alguém. Uma hora e onze minutos chegava mais do que o suficiente para que se lembrassem dele. Quantas novidades teria? Fez login no facebook. Please wait.. Nada. Ninguém gostou ou sequer se importou o suficiente para frisar que não gostava do regresso dele à actividade online. F5 F5 F5 F5 F5 F5 F5 F5 F5 F5 F5. Zero. Sinais nenhuns do avisozinho vermelho com a chegada da novidade. Um comentário e dois ou três likes seriam o mínimo da decência. Mas não: nenhum interesse no B.D. Cruel. Ofensivo. B.D sentiu-se exposto. Só. Num bom dia B.D conseguiria ter eco de quase todos os seus posts, inclusive de meninas. Sentia ser algo que lhe validava a condição. Mas assim não. Naquela noite B.D ficou sozinho na mesa – foi o único a quem ninguém puxou para dançar. F5 F5 F5 F5 F5. Tudo parado, igual. “Não estou aqui, isto não está a acontecer”, pensou, lembrando-se do Thom Yorke. “B.D em baixo”. Tenho pena dele.
terça-feira, 24 de maio de 2011
"Não é amor, são só manchas nas minhas calças"
Os Amantes, René Margritte (1928) |
Percebeu que iria ficar sozinho no dia em que descobriu que ela não sabia rir, e sentiu um alivio de morte. Chegou-lhe na surpresa de uma porta na cara: viciara-se na ideia de estar só. Por ela, a ideia, deixou-se consumir. Quando deu conta já era tarde de mais. Há muito que procurava uma saída de emergência, e, enfim, encontrara-a. Deixaria de a contactar, de responder a convites, de frequentar os mesmos locais. Agora sabia-o. Apagaria todos os vestígios daquela hora diária de cama, daquela furiosa e desonrada hora diária de cama, miserável excitação irrepetível, prazer e mentiras e despudor e culpa. Num verbo: partir. Nisto, regressou a si próprio. Era, a partir dali, novamente só.
sábado, 21 de maio de 2011
Um bom título não chega pá
Apetece-me dizer que o Vasco Câmara me enganou, eu que tanto confio no potencial de um filme que, de zero a cinco, dele mereça duas, uma (foi o caso) ou estrela nenhuma. Também gostava de acusar o miudo (23 anitos) realizador (Xavier Dolan) de ter visto quatro ou cinco DVD do Wong Kar-wai e decidido “fazer qualquer coisa do género”, dizer que se pede mais a um suposto géniozinho do que ter um par de ideias fixas – pára de bochechar tabasco, rui! - e que a mensagem do filme é esta: tudo o que temos se resume a acrobacias na cama, porque, amor, só imaginado. Ou então sou só eu a ser mauzinho – eu e a minha alergia à cópiazinha fácil, ainda para mais quando feita a um dos meus filmes favoritos. Rsrsrsrs.
quarta-feira, 18 de maio de 2011
Em Portugal já ninguém compra discos, pá!, o tuga grama é música estrangeira, portuguesa só a sacar da net, pá!, não se apoia o que é português, não se gosta do que é nosso, pá!
Um robalo e quatro cervejas depois, eu e um amigo, que poderia até ser talhante mas passa por ser camarada jornalista, chegamos à porta do Musicbox, meia hora antes de começar o concerto d’Os Velhos. Preço: dez euros; prémio: espectáculo musical e novo disco da banda. Chego-me à frente.
- Olá.
- (Segurança do Musicbox) Boa noite, que desejam?
- Viemos ao concerto.
- Esgotou.
- Esgotou?!
- Esgotou.
- Esgotou quando?!
- (Badameco da organização antecipa-se) Esgotou esta tarde.
Aproximam-se duas miudas giras. Chegam à porta de entrada e a conversa repete-se. Entristecem, mas deixam-se ficar por ali, junto ao segurança e ao badameco. Uma das miudas suspira e enrola as pontas do cabelo com a ajuda do indicador, uma e outra vez; a outra está impaciente e faz sinais difusos. Tento processar que tipo de mensagem transmite mas faltam-me códigos e leituras. Já afastados da fila, eu e o meu amigo avaliávamos as nossas opções. Compreendemos que não as tinhamos. Nada a fazer: não há contactos. "Vamos subir para a bica." Quem não arredava as ancas dali eram as miudas giras. Continuámos atentos às movimentações. Uns minutos. A dada altura desistimos. Bica. Um, cinco, dez, vinte metros à frente dou um toque no ombro do meu amigo e sugiro-lhe que se vire e note até que ponto as miudas ainda estão onde estavam, se tudo estava como esteve.
terça-feira, 10 de maio de 2011
sexta-feira, 6 de maio de 2011
Come together
O Yann Tiersen é o príncipe das quase trevas, do outono, da beleza oculta, da falta de ar, do interior, do cansaço, de uma qualquer era perdida, e põe-te a cantar ‘fuck me fuck me fuck me, make me come again’ como se fosse ‘la-di-da’. E eu não fui ao LX Factory - estou a tornar-me especialista em falhar concertos de gente que amo. Mas tenho um emprego novo. Ar fresco. E ontem a São José Correia quase me roubou o casaco no Lounge. E uma miuda mostrou as mamas na pista de dança do Roterdão. É disto que o meu povo gosta.
quarta-feira, 4 de maio de 2011
Há coisas que nunca mudam
Cada um é de onde vem e na forma de quem o rodeia. Nada tenho contra a malta que se identifica com o Inverno, que não resiste a um bom dia de ossos a tremer, roupa encharcada e pele amarela, mas eu cá gosto é de ter os pés bem assentes na areia e num ameaço de espuma ver as ondas morrer aos pés de gente escurecida pelo rei sol, com rugas de expressão e sem pressa, eu é mais tirar o salitre do corpo, caracóis e cerveja gelada ao fim do dia, demorar-me no regresso a casa - "vamos a pé?" - e chegar com o cheiro de peixe fresco a virar na grelha, ouvir o canto estridente dos grilos em noites brancas de jantar na rua e viver paixões destinadas a acabar estateladas contra as rochas. É isso que eu quero. Sou.
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