O tempo uniu o meu irmão ao Inverno. Não escrevo isto para
que soe bem, ele gosta mesmo de frio e chuva, de um certo ambiente de fim de
mundo. E tanto gosta ele de tais encantos que, a custo, moído por uma noite
longa, lá tirou o corpo da cama numa tarde pouco agradável e foi mexer os ossos
para o passadiço de Alvor. Eu fui atrás, desconfiado. A minha mãe também. A habitual confusão de atletas, casais e cães naquela zona
que envolve a ria de Alvor dava lugar a coisa nenhuma. À primeira vista
estávamos sozinhos - enganei-me -, o que não me surpreendeu, dado que chovia e
bem. Já no passadiço, e portanto à chuva, cruzámo-nos com
dois cães que brincavam. Ao ver-nos passar por eles, acompanharam-nos em
silêncio, muito dignos, durante centenas de metros. De fato de treino, o meu
irmão ria-se; de calças de ganga, eu apercebia-me que já tinha o tecido bem colado às pernas. Mais à frente cruzámo-nos com um casal de
estrangeiros. A minha mãe ficara no carro. “Está a chover”, constatou. Voltámos como volta quem esteve meia hora à chuva. O meu irmão, satisfeito,
conseguira despertar o corpo moído ao mesmo tempo que contemplava a natureza
sem cor ou temperatura humana - perfeito. Eu, que me tinha portado bem na
véspera, ganhei pingos no nariz e a voz do Richard Hawley.
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