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pedro rios (cabelo mais curto) e rui coelho (cabelo mais comprido), algures lá atrás depois de verem wrestling a mais enquanto a minha tia se iniciava nas artes da fotografia, primeira aula |
Há sempre alguém que nos diz, "tem cuidado", e no meu caso é o meu pai. Sempre achei que ele exagera no antecipar das consequências, que vê perigos a mais por aí, e nisto reflectia no interior do meu carro quando me apercebi que tinha deixado o telemóvel no balcão do nosso bar, na Rocha, depois de me ter despedido dele. Começava com disciplina um trajecto de 600 km até Espinho, três dias para terminar férias com ‘escala’ em Lisboa, estacionar o carro e regressar aos comboios. Dei meia volta, recuperei o telemóvel sob o olhar reprovador do meu pai, com ligeiro abanar de cabeça – “tss, tss” em balão de cartoon - e galguei o país.
Passou pelo menos metade da minha vida desde a última vez que tinha estado em Espinho. Dessas sucessivas férias de Verão cinzento com o meu primo Pedro guardava pequenas noções de espaços e pessoas, mas a maioria foi-me apresentado como novidade.
Depois de uma primeira noite calminha no Porto, com passagem pelas galerias e armazém do chá, passei o dia de sexta-feira a passear pela capital do vólei em Portugal, na qual uma avenida está baptizada com os nomes do Miguel Maia e do João Brenha, heróis da terra. Uma das coisas que me surpreendeu e que decerto já me tinha sido dito quando era puto é que Espinho dá a mão a Nova Iorque nisso de numerar as ruas ao invés de as nomear. Não tem nada que saber: as ruas paralelas ao mar são pares; as perpendiculares, ímpares. É mais fácil não nos perdermos em Espinho, uma rampa gigante que liga a casa do meu primo (nascente) ao mar (poente).
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Espinho é tipo NY |
Caminhámos ao longo da marginal observando a paixão dos surfistas – aqui o mar é ‘brabo’ e frio, nada a ver com a piscina sem ondas que banha o algarve – e depois seguimos para o centro da cidade. Homem culto e reservado que só abre a boca quando tem algo a dizer, o pai do meu primo relatava-me como tudo já tinha sido diferente, insistindo no pretérito perfeito do verbo ser para das coisas falar. Das minhas memórias de uma cidade e respectiva área circundante altamente industrializadas pouco restou: as fábricas estão fechadas, os grandes empreendimentos foram demolidos ou abandonados e os novos aterram na paisagem urbanística como naves espaciais – casos do multimeios ou da biblioteca, recentemente aberta sem mobília. A favor: a cidade é pequena, mas tem tudo num curto espaço geográfico: hospital, escolas, mar, casino ou infra-estruturas desportivas que fariam corar de orgulho qualquer cidade - estádio de futebol do Espinho à parte.
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a via pública é mesmo pública no bairro dos pescadores |
O melhor de Espinho, além dos (últimos) dias e noites de Verão que por mim esperaram? As pessoas, uma delícia para qualquer visitante ávido de conhecer o que se passa. Fiquei particularmente encantado com o bairro dos pescadores, onde a via pública é utilizada para estender a roupa. No dia seguinte, durante um jogo de futebol amador, percebi o motivo pelo qual é melhor a câmara municipal não se meter com as gentes vareiras. Antes de regressar a casa para lá deixar o pai e recuperar o filho, fui ao Picoto, a pedido.
Eu e um amigo que muitas vezes me acompanhou a Queimas do Porto sabemos há alguns anos que o Picoto existe, mas nunca fizemos ideia de quais as coordenadas. Frequentemente passávamos pela placa certa, a não sei quantos km, ficando fascinados pelo nome, mas nunca ninguém nos soube explicar onde ficava, que tipo de terra era, essas coisas. Como o pai do meu primo tinha nascido lá ao pé, levou-me onde eu queria. Ou assim achava. Consegui tirar uma fotografia ao lugar do Picoto, mas não vi nenhuma placa indicativa de que o Picoto era o Picoto. Mèrde.
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este cruzamento é no coração do Picoto, juro Marcos! |
Quando passeei ao longo da marginal gostei especialmente da pinta de um café, o Barco Boador, ao qual regressei assim que o meu primo saiu do trabalho. A empregada, que tinha “o namorado mais fodido para a pancada da cidade”, aviso do meu primo, trouxe-nos dois finos e um sorriso sedutor. Na aparelhagem, Beatles. Quando os fab four se calaram pedi-lhe para repetir a passagem do disco e ela olhou-me de um modo indecifrável, não sei se odiou ou amou. Apostaria na última opção. Misteriosa, a miúda. Ao fim do dia muitos casais fotografavam o horizonte entre beijos e caminhadas sem pressa. A nossa mesa ia ganhando mais pessoas. Por lá passou a Cristina, irmã do Pico, a Jo, namorada do meu primo, e também a Cristina Pinto e a Melissa, aquele tipo de mulher de quem é fácil gostar mais do que se deve. Ao grupo ainda se juntou o Rapper - nadador-salvador e DJ que vinha de férias no Dubai e arredores - e uma estudante de medicina, cujo nome não recordo, acompanhada da respectiva mãe, por quem cruzei a estrada de prato na mão para oferecer parte da minha salada de búzios, que aterrara há segundos na mesa. Uma espécie de “venho em paz” do Novo Oeste, ao pôr-do-sol.
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no Barco Boador |
Jantámos no restaurante “Parte o Prato”, no Porto – eu, o Pedro, a Jo, a Melissa e mais duas amigas da Jo - a Joana e a Marta. O batalhão de amigos do meu primo não tem fim, nem papa grupos. Uma grande família, quase toda a viver num raio de poucos quilómetros e unida pelo amor ao reggae. Qualquer amigo do meu primo ouve reggae. É uma forma de vida.
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jah bless |
Pedi um bife Serrano com batata a murro e entornei vinho da casa. Antes, pão com alho e queijo. Depois café e uma entrada a pés juntos na noite com um shot de tequila no bar Praça. Por ali conheci o Ivo, um dos dois amigos do meu primo que tem o bom gosto de ser sportinguista. Troquei impressões igualmente com o Pedro, que perdeu o pai há pouco tempo e merecia uma especial atenção de todos aqueles que o conhecem. Loucas, a Débora e a Diana também agitavam as águas. A noite acontecia.
Hesitámos muito sobre a discoteca à qual acorrer. Do meu lado a opção recaía num espaço que destilasse algum tipo de rock, mas só a Melissa me acompanhava nesses apetites. Por isso mesmo fomos ao Tendinha ainda cedo, só a ver o que se passava, e lidámos bem com a casa vazia. Pedimos aos seguranças para nos deixarem entrar, pulámos 20 segundos ao som de qualquer coisa antiguinha e de lá fugimos. O regresso far-se-ia mais tarde, num registo menos descontraído.
O Pitch foi a escolha. Supostamente deveria acontecer por lá uma festa de moda. Falso alarme. Uff. O clube tinha dois pisos – o superior era bar, com um som electrónico mais calmo e alternativo; o de baixo, discoteca, com um martelo ou outro. Gostei do conceito, não gostei da música, em qualquer dos casos menos arrojada do que o pretendido. Daí que tivessemos ido embora. Esperava-nos a GARE, onde haveria uma festa de ‘drum’ com Marcelinho da Lua. Houve também tempo para visitar uma pista onde passava hip-hop e r&b, um tipo de shake a evocar andamentos de outras vidas. O ambiente era festivo e da paz. A casa esteve longe de encher. Já de manhã voltámos de comboio, eu e o meu primo, resistentes da noite depois de nos termos chateado à porta do Tendinha, no qual todos pretendíamos entrar, menos ele, que tinha aprontado uma com um segurança horas antes, sem nós sabermos.
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deitar cedo e cedo é erguer é para malucos |
Nessa noite conheci também o Moreira, que vive nos prédios-irmãos àquele em que reside o Pedro, e que joga futebol amador no Rio Largo. Na tarde seguinte ele tinha jogo do campeonato popular de Espinho e demonstrei interesse em ver aquilo. Mal acordámos, com um cabeção olímpico, acorremos à cozinha para almoçar e de seguida viajámos um punhado de quilómetros até ao campo, situado em Idanha. Havia muita gente a assistir ao jogo e pouco espaço para estacionar. Chegámos com a primeira parte a meio. Tal era a quantidade de carros nas redondezas que o Pedro optou por encostar o dele junto ao portão de uma casa, de tal modo que quase tapava a saída da garagem, mas o dono depressa apareceu a enrolar o bigode, depreocupando-nos.
- Eu não devo morrer enquanto o jogo decorre, mas se morrer a minha mulher atira-me ao rio.
Agradecemos as palavras sábias do senhor e fomos directos ao bar do clube investir num par de minis, 50 cêntimos cada. (Juro).
Por aquela altura fiquei a saber que o Rio Largo é um dos clubes mais fortes da prova, e defrontava a aguerrida equipa do Cantinho, oriunda precisamente do bairro dos pescadores, o tal onde a via pública é espectacular. Numa das margens do campo pelado corria um rio, que não o Largo, e na outra passava um troço de auto-estrada. O Cantinho jogava ali, em casa emprestada.
Logo nos primeiros minutos percebi que o Moreira, dez nas costas, posicionava-se a médio ofensivo, frequentemente a cair para as alas, sobretudo a esquerda. Em redor do campo encontravam-se várias figuras ilustres da cidade, casos do senhor Sousa, que faz os melhores panados de Espinho, do presidente honorário do Rio Largo, largamente falho de dentes no teclado superior, e também do dono do Zé Grande, casa onde as sandes de presunto podem alimentar uma família católica de etíopes subnutridos, garantia da Cristina Pinto.
Há uns anos falava muito ao telefone com a Cristina, sem saber muito bem porquê. Esta foi a primeira vez que a conheci, olhos nos olhos. É uma mulata branca, ou uma branca mulata, simpática à brava e também ela amante de reggae – talvez por isso, pelo volume alto do som que trazia no carro, quase me atropelou diante do Barco Boador, na tarde da véspera. Correu tudo bem.
Para surpresa minha, o jogo estava a ter muita qualidade. Ambas as equipas tinham jogadores talentosos e preocupavam-se em tratar bem a bola. Poucos charutos para o mato. O Rio Largo tinha mais bola e a meio da primeira parte o Moreira foi lançado na cara do guarda-redes do Cantinho, mas perante a carga pelas costas de um defesa contrário rematou fraco, à figura.
Grande oportunidade desperdiçada, coisa que não nos assistiu, a mim e ao Pedro, no momento de atacarmos a segunda rodada de minis, ao intervalo. Antes, o primeiro golo do jogo para o Rio Largo, com assinatura do Quim Nando, rapidamente por mim baptizado de Andrea (Pirlo). O “21” apanhou a bola a pinchar e de muito longe, sem companhia em redor, aplicou-lhe veneno direccionado ao ângulo superior direito. Um espanto de golo.
Ao contrário do que seria de prever, o intervalo foi pouco agitado no bar. Não que houvesse lá pouca gente com sede, mas porque as minis já eram. Má sorte dos donos, ou gestão duvidosa, como lembrou o meu primo. À remessa seguinte já todos nos babávamos por uma fresquinha. O sol nunca perdoou.
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r.i.p. t-shirt e calções e havaianas 2011 |
Um dos adeptos mais inquietos era um senhor cheio de escoriações no rosto e várias tonalidades de pele nas mãos. Vestia todo de ganga – o casaco mais escuro que as calças. O meu primo teve pena dele e ofereceu-lhe uma mini com o meu dinheiro, sendo depois louvado por Deus pelo senhor da sede, agradecido como quem recebeu o primeiro gesto de caridade em todo o ano civil.
No regresso dos balneários o Cantinho surgiu mais forte, enquanto o sector criativo do Rio Largo ficava sem pernas. O Moreira ainda jogou bonito aqui e ali, somando uma coxa, toques consecutivos sem deixar cair a redonda e um canto olímpico devolvido pela trave, mas seria substituído juntamente com um dos avançados mais rápidos ali à hora de jogo. Resultado: o Rio Largo ficou sem ideias na frente, o Cantinho entusiasmou-se e com o apoio ruidoso das vareiras chegou ao empate por um quase anão que fazia diabruras pelo flanco esquerdo. A divisão de pontos custava especialmente ao presidente honorário do Rio Largo, já de si furioso por ter sido esquecido numa das rodadas de minis, ele que reclamava já ter acabado os antibióticos na semana transacta. Num jogo do campeonato popular de Espinho a cerveja é como água, não se nega a ninguém.
Mas o verdadeiro foco de interesse ocorreu ainda antes do fim de um jogo que não chegou a acabar. Ao assinalar de um penálti discutível a favor do Rio Largo, com dez minutos para se jogar, os jogadores do Cantinho cercaram o fiscal de linha que o indicou e não houve mais jogo para ninguém, ordem do árbitro principal. A partir daí só se berrou, insultou, perseguiu e agrediu. Com as garrafinhas vazias de cerveja aos pés, eu e o meu primo ríamos muito. Um adepto do Cantinho que tinha passado o jogo com a perna direita em cima da barra que separa a assistência do campo, exibindo alguns centímetros de osso e a meia esticada por baixo da calça de fato, e outro vestido de fato de treino fizeram os 15 metros obstáculos para aviar o juiz assistente e só não o conseguiram porque foram travados pelo primeiro incendiário da coisa, que revelar-se-ia simultaneamente o primeiro samaritano do pedaço. Paulo Cavalo, de nome. “Não admira que seja Cavalo, só dá coices” – dele se disse durante o jogo. Atleta do Cantinho, o Paulo Cavalo é daqueles avançados a rondar os 40 anos, que sabe tudo da bola mesmo que corra pouco, e domina a situação. Domina também a terra do pelado, que agarrou para arremessar à cara de um adversário durante o jogo, e mantém igualmente um amplo domínio das próprias mãos, que utilizou para aplicar uma valente lambada num defesa contrário. Em nenhum dos casos viu sequer o amarelo. Nem aí, nem a seguir do apito para o penálti que não chegaria ser cobrado. No meio daquela confusão toda, com o Cavalo a relinchar encostado à cara do rapazito da bandeirola - “Eu deixei os meus filhos em casa, caralho!!!” - e de novas tentativas de agressão por parte do senhor da meia e do de fato de treino, o árbitro decidiu dar o encontro por terminado. 1-1, mas o Rio Largo deve ganhar na secretaria, opinei ao meu primo, que devolveu: “a secretaria é num tasco ali em baixo, escolhe-se um representante de cada equipa e quem beber mais, ganha.”
Maturei um bom bocado nos méritos daquele tipo de julgamento, e depois virei a agulha, pensando, como vai aquele fiscal de linha com cara de moço de recados regressar aos balneários? Uma multidão esperava-o, sendo que as gentes do bairro dos pescadores estavam em maioria. Houve dois ensaios. O primeiro teve falsa partida, com demasiadas pessoas a espumar pela boca e a encurralar o xavalo para o moer ao punho fechado. No caos uma senhora levou uma chapada e ficou fora de si durante mais que muito, para desespero do marido, que não tinha visto nada – veredicto: culpado.
À segunda, já com o miúdo da bandeirola protegido pelo incendiário de Calcutá Paulo Cavalo e um responsável do Rio Largo, lá se deu a entrada nos balneários do trio de arbitragem. Sempre achei os árbitros loucos. Agora, que conheço aqueles que apitam nas provas amadoras, sem policiamento, vejo tudo numa outra dimensão.
Já de banho tomado, o Moreira assistia a tudo junto de mim, do meu primo e do Ricardinho, o amigo mais alto do meu primo, aquele que tinha entrado pelo Rio Largo no decorrer da segunda parte e dava-se o caso de ser casado de fresco. Não podia jantar connosco, horas depois, para desconforto da Jo, que queria o casal junto dela, mas apareceria na discoteca que abria em Espinho naquela noite, acompanhado pela mulher. Discoteca que, ao que se dizia, abria somente até Janeiro, a título experimental. DJ para cortar a fita: Rui Vargas.
Sabia e continuo a saber pouco da noite no Porto, mas também não andava famoso quanto aos locais obrigatórios a visitar durante o dia. Insisti na Casa da Música e lá me levaram. Já passavam das 18:00 mas nunca nos passou pela cabeça que a circulação no espaço estivesse vedada a todos os pisos, excepto o da entrada, que sucintamente nada tinha que valesse a pena ver. Abordei uma funcionária e esta explicou-me – “o último horário de visitas foi às 16:00, agora só amanhã de manhã”. Fiquei fodido mas sorri-lhe com a mesma candura com que de seguida fui vagueando até ao corredor oposto do piso, muito atento a tudo, e comecei a subir os degraus rumo ao segundo piso, conduzido pelo som de uma orquestra sábia. O Pedro e a Jo fizeram o mesmo, sem que tivessemos combinado coisa alguma. O que tem de ser tem muita força. Fomos apalpando a estrutura, embevecidos com cada detalhe pensado pelo Rem Koolhaas (e não o Siza, ó burro) – a Jo estava especialmente interessada em sorver tudo, é arquitecta. Continuámos a subir. No terceiro andar vimos uma parede almofadada em triângulos expostos e nela encostei a cara num desconforto fofo. Também por ali havia bancos feitos integralmente em cortiça, o que não deixou de espantar o meu primo, que trabalha nos Amorins. Continuei a subir e cheguei à cafetaria VIP, de onde se podia ver o anfiteatro principal através de uma vidraça. Estava a decorrer um concerto não sei bem de quem. Ao meu lado podia ser visto pelas pessoas que ocupavam a sala, cheia que nem um ovo. Observei os movimentos histéricos do maestro, com resposta a preceito dos músicos, e tirei o som do telemóvel. Desviei o olhar para o terceiro piso e vi o Pedro a beijar a Jo. Senti-me bem. Quando eles se aproximaram do som até o poderem “ver”, apareceu um segurança em sobressalto.
“Boa tarde!, não podem estar aí!”
O meu primo perguntou-lhe, auto-estupidificado, “ai não? Ah..”, enquanto eu fazia uma expressão de espanto pouco convincente. Aguentei mais uns segundos para tirar um último retrato mental e comecei a descer até à saída, com o segurança atrás de nós a fechar as portas pelas quais tinhamos entrado onde não era suposto. Puta que pariu as câmaras de segurança. Saímos com a sensação de termos feito uma 'visita de médico' em que sempre se disse olá.
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porto sunset, sem photoshop |
Dali fomos lanchar junto ao mar, num café onde pedi um doce tradicional – folhado com creme de ovos, por indicação de uma funcionária atenciosa -, um galão e uma tosta de queijo com pão alentejano. Depois fomos para casa estender as pernas até ao jantar, que seria na Associação Beneficiente dos Amigos Pobres de Grijó. O espaço era assim: entrávamos numa sala típica de tasco onde se vê a bola e se joga às cartas e seguimos para outra de restaurante. Sentámo-nos numa mesa redonda situada no palco do que em tempos foi um teatro. Personagem principal: o barro, que servia de base para toda a loiça. A comida foi servida em telhas. Picanha servida em telhas e regada com o tinto certo.
Fomos quatro na mesa, eu, o meu primo, a Jo e o Moreira, e em breve pareceríamos oito. Eu pelo menos já me sentia por dois quando pedi Jameson à menina que nos atendia, tendo porém que optar por JB 15 anos quando ela me respondeu, “James? Não temos”.
De Grijó voltámos a Espinho, rumo ao Delícia, o café onde tudo começa. Ali conheci mais uma mão cheia de amigos do Pedro enquanto a TVI filmava uma minha conterrânea a enfiar-se debaixo de um cobertor e a estacionar de boca entre as pernas de outro concorrente do programa dos segredos.
“Portimão, respect!!”, gritei.
Próxima paragem? A zona dos bares em Espinho, de perfil com o Barco Boador, e aí encontrei o que tanto queria, finalmente: um bar que passasse rock. Fartei-me de curtir, chateei o DJ tanto quanto podia e fui feliz. O DJ, com tanta e tão rara atenção aos gostos dele, também não se queixou. Drums, dEUS e outros que tais deixaram-me com moral para atacar a discoteca Abox. O nosso grupo era grande, mas faltou a Cristina, que vinha de um casamento, exausta, e a Melissa, também ela exausta da véspera. Ao invés, conheci outros amigos, como o Backup, que estava a treinar para uma maratona e tinha corrido duas horas. Antes ainda fui a outro bar atacar o bolo de uma aniversariante que não conhecia, mas era no Abox que acabaríamos a noite. O som era porreiro, um pouco repetitivo. O ambiente era de bom gosto, excepto quando uma rapariga com musgo nos dentes quis invadir a cabine do DJ, uma e outra vez. Menos gente do que seria suposto. Aguentámos umas belas horas a gingar e já com o meu primo estendido no carro fui com amigos dele comer ao café Latina, onde entrei com um colar do havai e um chapéu indígena como adereços, ou coisa que o valha. Um grupo de mulheres rodeou-nos e declarámos que aquela seria a minha última noite da despedida de solteiro. Casar-me-ia dentro de duas semanas, em Barcelona. Recebi votos de felicidades e a especial atenção de todas, com destaque para a mais velha, já nos seus cinquentas e a única que parecia realmente feliz por me saber prestes a contrair matrimónio. Uma merenda, um galão e muitos conselhos depois, despedimo-nos com afecto.
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ia fonde ma na sende |
O meu cabeção ao acordar era de novo significativo, mas ficaria ainda maior quando vi a minha adorável tia munida de um saco cheio de comida para eu levar para Lisboa. Trouxera para o Norte uma mochila às costas e voltaria para Lisboa com o supermercado nas mãos. Ele era tupperwares com carne e batata cozida, outros com sopa, sacos com pão, fiambre da perna, queijo, pacotes de massa, leite e fruta. Quando cheguei a lisboa descobri um ovo embrulhado em prata. Não sabia o que dizer mas enchi a minha tia de beijos e deixei pelo menos a fruta e o leite na cama, só para que o fecho da sacola inesperada não ficasse arruinado.
Depois de almoçar no café que supostamente teria a melhor francesinha da cidade - falso alarme: encontrei o bife a meio da refeição, mas depois foi-me explicado que quem cozinhava bem era o pai e não o filho, sendo que era este último que estava ao serviço -, e de ver o City fazer pouco do United no dérbi de Manchester, em Old Trafford, despedi-me e apanhei o comboio das 17:07 sob um temporal revelador. Depois de dias perfeitos, o Verão terminava ali.
Nisto pensava quando, entrando num comboio, comecei a atavessar carruagens a fio à procura da minha até encontrar o “pica”, que me explicou ter apanhado o comboio errado. Teria de sair em Aveiro. Assim o fiz e esperei até aparecer o meu, no qual estive cercado de moças estudantes e passei mais tempo a recolher-lhes as malas da bagageira estupidamente alta do que propriamente a dormir ou ler. A senhora de idade que se sentou ao meu lado aproveitou a deixa e pediu o mesmo. No fim ofereceu-me bolachas maria. Qualquer coisa já tenho emprego.